Para dirigentes de instituições, faltam critérios para abertura de cursos superiores, o que acaba tendo reflexos negativos na qualidade do ensino

Oprincipal responsável pela baixa qualidade do ensino superior no Brasil, revelada pelo Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), é o Ministério da Educação (MEC), na avaliação do presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep), José Antônio Teixeira. “Se o curso é ruim, por que (o MEC) deixou funcionar? Não pode deixar funcionar”, reagiu Teixeira ontem, um dia após a divulgação dos resultados. Para Teixeira, em vez de anunciar os resultados do exame e “estigmatizar os alunos”, o MEC deveria fechar as escolas que não têm padrão de qualidade.

Também na opinião do presidente do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos Particulares de Ensino Superior do Distrito Federal (Sindepes), Maurício de Souza Neves Filho, a qualidade da educação vem sendo prejudicada pela total falta de critérios do MEC para a abertura de novos cursos superiores.

Teixeira contesta ainda a informação de que os cursos das universidades públicas são melhores do que os das faculdades particulares. “Os melhores alunos da rede oficial foram os melhores alunos nas escolas particulares de ensino médio. Isso o MEC não divulga”, disse. De acordo com o Enade 2006, a incidência de cursos com  conceitos 1 e 2, os piores da escala usada pelo MEC, no setor privado (30,2%) é quase o dobro do registrado nas escolas públicas (16,9%). A diferença se acentua mais ainda nos conceitos 4 e 5, os melhores: 54,3% dos cursos das universidades públicas contra 16,2% nas escolas particulares.

Formação

Segundo Teixeira, a explicação seria simples: as escolas públicas mantêm processos rigorosos de seleção e recebem os alunos que tiveram melhor formação no ensino básico, na maioria das vezes vindos de boas escolas particulares. Enquanto isso, segundo ele, há escolas particulares que exigem apenas uma redação — às vezes feita em casa — para o ingresso num curso superior. “A situação é muito preocupante”, afirmou Neves Filho.

No Distrito Federal, em 10 anos, segundo ele, o número saltou de 10 para 65 escolas superiores. “Estamos com uma faculdade aqui em Brasília com três meses de salário atrasado”, denunciou. Essa escola, segundo ele, a qualquer momento, pode fechar as portas. “E quem vai ressarcir os alunos?” Além dos alunos, afirma ele, há prejuízo para os cofres públicos, já que a instituição recebe recursos do Programa Universidade para Todos (ProUni). O presidente do Sindepes-DF denuncia ainda a prática de fraudes no processo de abertura de faculdades: “Tem professor que dá o nome para três ou quatro faculdades diferentes obterem o registro no MEC”. Com isso, afirmou ele, o Ministério autoriza a abertura “de faculdade sem corpo docente”. Outra falha, além da falta de critérios para a abertura de cursos, diz ele, é que o MEC não fiscaliza as instituições.

Supervisão frágil e falta de técnicos

O secretário de Ensino Superior do Ministério da Educação, Ronaldo Mota, reconhece que o ministério tem parte de responsabilidade na qualidade do ensino brasileiro. “A grande fragilidade do MEC é que não temos hoje um corpo técnico para a supervisão dos 20 mil cursos existentes”, disse. Esse problema, segundo ele, é amenizado com a implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), do qual o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade) faz parte. O sistema vai mostrar onde estão os pontos fracos. “Nossa capacidade de supervisão é muito limitada. Temos dificuldades estruturais graves”, explicou.

Segundo Mota, há situações muito diferenciadas no setor, inclusive casos “no limite de fraude, de enganar o  estudante que ingressa em um curso” que não têm autorização para funcionar. Com o sistema de avaliação em funcionamento, o poder público “vai ter os instrumentos eficazes e justos” para agir. Para o secretário, o resultado do Enade permite várias análises, mas a conclusão do diagnóstico depende de outras etapas, como a de avaliação institucional. Segundo ele, o exame também trouxe informações positivas. É o caso dos estudantes do Programa Universidade para todos (ProUni), que tiveram bom desempenho no exame. “O programa incorpora setores com muito talento, que estavam excluídos”, comentou. Ele lembra que há três nos muitos diziam que o ProUni iria baixar a qualidade do ensino.

O presidente do Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras (CRUB), reitor Nival Nunes de Almeida, concorda que o Enade “é um avanço para a educação brasileira”, porque incorpora também a avaliação do  conhecimento agregado pelo curso ao estudante. Com isso, as faculdades saberão onde estão errando e podem “buscar uma correção de rumos”. Para José Antônio Teixeira, da Fenep, o ideal é criar uma câmara setorial no MEC, com a participação de todos os envolvidos, inclusive dos empresários que vão contratar os formados, para adotar medidas para melhorar o ensino no país. (GE)