Protesto de estudantes acaba em choque com policiais e bloqueio de acesso; decreto de Serra tenta pôr fim à crise

Uma manifestação de alunos, servidores e professores das universidades estaduais paulistas resultou em confronto com policiais militares e no bloqueio de uma avenida da zona oeste de São Paulo por cinco horas, ontem.

Os manifestantes partiram, no início da tarde, do campus da USP, onde um grupo ocupa a reitoria há 29 dias, e tentavam ir até o Palácio dos Bandeirantes protestar contra a política educacional da governador José Serra (PSDB).

Participaram da passeata cerca de 5.000 alunos, funcionários e professores de USP, Unicamp, Unesp e Fatecs, segundo os organizadores; na contagem divulgada pela Polícia Militar, foram 2.000. Todo o trânsito na região foi afetado.

O grupo foi barrado por cerca de 500 policiais a 1 km do destino final, no cruzamento das avenidas Francisco Morato e Morumbi. Houve pelo menos cinco tentativas dos manifestantes em furar o bloqueio. Para contê-los, os policiais usaram spray pimenta. Na confusão, um aluno recebeu um golpe de joelho na barriga. Outro acabou detido, no momento mais tenso do confronto.
O rapaz, identificado por colegas apenas como Guilherme, furou o primeiro bloqueio e se jogou sobre os escudos do pelotão no segundo cordão de isolamento –havia, ao todo, quatro cordões. Ele foi detido por cerca de uma hora e liberado.

“Eu sou um servidor militar e cumpro determinações”, disse o coronel Alaor José Gasparato, comandante da operação, sobre a proibição da manifestação nas proximidades do Palácio. A justificativa da PM é que os 500 metros do entorno do Palácio são área de segurança.

COMISSÃO – Uma comissão foi recebida, no Palácio, pelo secretário-adjunto da Casa Civil, Humberto Rodrigues da Silva, e por Gustavo Húngaro, assessor do governador, mas não conseguiu a liberação da passeata. “Mais uma vez, o governo foi intransigente. Não houve nenhum acordo”, disse Beth Lima, uma das presentes na comissão. O bloqueio, que teve início às 14h37, foi encerrado às 19h27. Os manifestantes, então, começaram a voltar para o campus.

DECRETO – O governador Serra publicou um decreto declaratório no qual tenta pôr fim à crise na USP, Unesp e Unicamp, que sofrem com invasões e greve contra o governo. No texto, o tucano tira algumas atribuições da Secretaria de Ensino Superior, um dos causadores dos protestos, e põe no papel o que havia dito desde o início da crise: que não há mudança em relação à autonomia das universidades.

A medida foi bem recebida por membros da academia antes críticos ao governo e pelos estudantes. Mesmo assim, uma passeata do movimento universitário contra Serra, marcada na semana passada, acabou em confronto, pois a PM bloqueou o acesso dos estudantes ao Palácio dos Bandeirantes.

O decreto de Serra, publicado no Diário Oficial, retirou da Secretaria de Ensino Superior, entre outras atribuições, a de “acompanhar e analisar o desempenho econômico […] de políticas […] de suas entidades vinculadas”. Tirou também do titular da pasta, José Aristodemo Pinotti, a competência de “submeter à apreciação do governador […] assuntos de órgãos subordinados ou entidades vinculadas à secretaria”.

O texto de Serra também retirou a função da secretaria de estimular a ampliação de alguns campos de pesquisa ou de formação de estudantes.
Setores da comunidade universitária –como os alunos que invadiram a reitoria da USP há 29 dias e os 23 diretores da Unicamp– alegavam que a Secretaria de Ensino Superior feria a autonomia das escolas. Os grupos exigiam a extinção da pasta.

Os invasores da USP divulgaram nota afirmando que “o governo, através do decreto declaratório, sinalizou que começa a entender a importância da autonomia universitária” e que a ação é um “início de diálogo”.

Eles se reuniram duas vezes com o secretário da Justiça, Luiz Antonio Marrey, mas não houve avanços. Ontem, afirmou que só negocia com a saída dos alunos da reitoria.

ESCLARECIMENTO – Serra, no novo texto, diz que o objetivo é esclarecer decretos anteriores que causaram “interpretações reiteradamente equivocadas”. Isso porque as medidas não deixavam claro se as universidades estavam inseridas em algumas restrições.

No decreto de ontem, o governador esclarece que as universidades podem fazer contratações; realizar negociação salarial internamente, sem aval do governo; remanejar recursos orçamentários; e reavaliar licitações ou decretos, sem a interferência do Executivo.

Todas essas posições já haviam sido manifestadas por meio de declarações ou ofícios de secretários. Setores da universidade, porém, entendiam que a situação era frágil, por isso era necessário refazer os decretos ou revogá-los.
O novo decreto, porém, não revoga a necessidade da prestação de contas diárias das universidades no Siafem (sistema eletrônico de execução orçamentária do governo) –que, antes, tinham de fazê-lo apenas mensalmente.