Assim que foi divulgado, o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE) recebeu um apelido: PAC da Educação, em referência ao Plano de Aceleração do Crescimento, anunciado pelo governo federal para incrementar a economia brasileira. Apesar das críticas (em sua maioria pontual), o programa foi bem recebido em quase todos os setores. Desde então, só aumenta a expectativa em relação às ações que serão tomadas. “Antes, tínhamos um Estado à procura de um plano. Agora temos um plano”, diz o ministro da Educação, Fernando Haddad, que dedicou quatro meses à análise, à discussão e à redação das diretrizes da Educação Básica para a próxima década. O bacharelado em Direito lhe deu a desenvoltura para produzir pessoalmente o texto legal. Sua decisão de soltar os detalhes do pacote pouco a pouco está ajudando a fazer com que todos se familiarizem com o projeto, entendam o tamanho do buraco em que nossa Educação está enfiada e se preparem para cobrar resultados. Até porque as metas definidas pelo Ministério da Educação (MEC) são ousadas (leia mais na reportagem da pág. 26): da criação do piso salarial para o magistério a investimentos pesados em formação (parceria da Universidade Aberta do Brasil com instituições de ensino superior), todas as grandes questões estão contempladas. “E a grande vantagem é que estamos propondo poucas mudanças na legislação”, afirma Haddad. “O que realmente importa é fazer valer as leis que já existem e valorizar a profissão docente”.

Nesta entrevistas exclusivas, dadas em seu gabinete no MEC, Haddad falou com franqueza sobre nossos problemas educacionais, respondeu a perguntas enviadas por leitores de NOVA ESCOLA e, com muito otimismo, abordaram as soluções que pretende implementar nos próximos anos para o ensino brasileiro, finalmente, dar o tão esperado salto de qualidade.

Nascido na capital paulista em 25 de janeiro de 1963, dia do aniversário da cidade, é torcedor do São Paulo. > Casado com Esteia, professora universitária, tem dois filhos: Carolina, sete anos, e Frederico, 14 Formado em

Direito, fez mestrado em Economia e doutorado em Filosofia. É professor licenciado de Ciência Política da Universidade de São Paulo.

CURIOSIDADE

A filha mais nova do ministro, Carolina, já estava totalmente alfabetizada aos 6 anos. “Ela sempre adorou ler e é fascinante ver o prazer que ela tem de aprender”, diz Fernando Haddad. Por isso, ele é um grande defensor da obrigatoriedade de matricular todas as crianças no Ensino Fundamental com   [ essa idade. “Isso    í é essencial para garantir um processo de alfabetização eficaz, a tempo de corrigir eventuais problemas. Aos que acreditam que isso rouba a infância, digo que, ao contrário, estamos dando a    i atenção necessária i para que todos tenham garantido o direito de , aprender.”

“A melhor remuneração e a boa formação ajudam no resgate da imagem, mas nossos professores precisam ser valorizados de verdade pela sociedade1

Por que podemos acreditar, agora, que a Educação brasileira vai melhorar?

FERNANDO HADDAD Porque até hoje todas metas estabelecidas pêlos governos anteriores eram de natureza quantitativa. Não era possível falar em qualidade porque não havia medido que permitisse acompanhar e comparar resultados. O Ideb (índice de Desenvolvimento da Educação Brasileira) vai nos permitir fazer uma radiografia precisa de onde o ensino funcionae onde é preciso melhorar, município por município, escola por escola. Graças à Prova Brasil, podemos hoje fazer essa avaliação e descobrir quais são os maiores problemas para atacar cada um da forma mais adequada.

Fazer rankings de escolas ou redes de ensino ajuda a comparar os resultados, mas nunca foi bem-visto por professores e especialistas. O que mudou para o MEC tomar essa iniciativa?

HADDAD –  Eu sei que os rankings não são desejados, mas precisávamos ter a avaliação universal da rede. Quando a avaliação foi introduzida no país, houve resistência. O governo insistiu e hoje ela é realidade. Mas percebemos que provas por amostragem funcionavam apenas como uma fotografia de baixa definição: não era possível enxergar os detalhes. Não sabíamos onde a Educação estava bem e onde estava mal. Essa falta de informação nos impedia de pensar em ações específicas. E as responsabilidades pêlos resultados ruins não eram atribuídas a ninguém. Em 2004, criamos a Prova Brasü, que nos deu esse olhar minucioso. O foco passou para os estabelecimentos de ensino, não mais sobre o Estado. Depois de divulgar as notas, nosso papel é oferecer apoio a quem precisa.

O que o professor pode fazer para o PDE dar certo?

HADDAD – Antes de pedir ajuda ao professor, acredito que a Educação brasileira precisa melhorar em três dimensões: salário, formação e recuperação da figura docente. Eu não tenho dúvida de que a remuneração deve ser condizente com o papel social que os professores precisam voltar a ter. O piso salarial atende parcialmente a essa demanda, valorizando a docente toda vez que o Congresso discutir o reajuste, anualmente. Da mesma maneira, a formação (inicial e em serviço) é essencial. Esse é, a meu ver, um tema complexo porque não se pode culpar só a ela pela má qualidade do ensino. O PDE prevê um reforço importante com os pólos da Universidade Aberta do Brasil. E o terceiro item, a recuperação da figura do professor, começa com os dois anteriores, ajudando no resgate da importância dos professores na sociedade.

O que será feito para resgatar a imagem do professor?

HADDAD – Para usar uma máxima conhecida: os melhores professores são os professores do Brasil! Um de nossos objetivos é enaltecer a profissão, veiculando pequenos programas no rádio e na TV para mostrar que são profissionais dedicados e que precisamos deles para vencer a guerra contra o ensino de má qualidade.

Em quanto tempo o PDE vai começar a mostrar resultados?

HADDAD – O plano exige poucas mudanças legais. Estamos propondo colocar no centro das atenções quatro aspectos: o aprendizado, a relação aluno/professor, a necessidade do envolvimento da comunidade e uma boa gestão. E quando falo em gestão não falo em economizar. Falo em gastar muito, mas de maneira eficiente. Este ano, conseguimos l bilhão de reais a mais do que o previsto originalmente no orçamento do MEC. Nossa meta é aumentar essa parcela suplementar em até 8 bilhões de reais, mas talvez não baste. Antes, tínhamos um Estado à procura de um plano. Agora já temos um plano. Eu sei que o MEC não está 100% preparado para executá-lo: ele é ambicioso e cheio de detalhes. Fomos ousados porque essa é nossa única opção. O país precisa urgentemente melhorar a qualidade do ensino e cabe a todos nós colocar essas ações em prática.

Por quê, então, a adesão ao plano é opcional por parte dos municípios?

HADDAD – Criar uma lei para obrigar todos a participar seria difícil e demorado. Optamos pelo caminho indutivo por acreditar que será difícil o prefeito de uma cidade com Ideb l ou 2 (a média nacional ficou em 3,7 na Prova Brasil de 2005) não querer ajuda. Enviamos pesquisadores para os 200 municípios que se destacaram na Prova Brasil para levantar os traços.