A abertura do mercado da educação superior às instituições particulares aumentou exponencialmente a oferta de cursos e o número de vagas, Por outro lado, como o número de alunos com condições de pagar as mensalidades não cresceu na mesma proporção, as instituições agora encontram dificuldades para se manter no mercado.

“Nos moldes atuais, não há condições de continuar a expansão” avalia o consultor Ryon Braga, especialista em Pesquisa de Mercado Educacional e presidente da Hoper, empresa de consultoria educacional. O momento atual, segundo defende Braga, é de consolidação do setor. “A estabilização da demanda e o aumento da concorrência vão lavará fusão e à aquisição de instituições, e ao fechamento daquelas que não conseguirem permanecer competitivas, num movimento semelhante ao ocorrido em outros setores da economia como os bancos e supermercados”, frisa Braga.

A previsão do consultor é que esse movimento de consolidação do mercado faça com que, das 109 instituições privadas presentes na Bahia, até 2010, não restem mais que 50. Porém, Braga assegura que os alunos não devem temer o processo, pois o aumento da competitividade faria com que só as me­lhores instituições permanecessem no mercado, o que elevaria a qualidade do ensino privado. Atualmente no Brasil, as 10 maiores mantenedoras do ensino superior privado são proprietárias de 157 instituições, entre faculdades e universidades.

BAHIA – Em fevereiro deste ano, a Faculdade Metropolitana (Polifucs) amargou os efeitos das mudanças no mercado da educação superior. Depois de alguns anos funcionando com dificuldades financeiras, os dono resolveram fechar as portas. “A situação ficou insustentável e os donos desistiram de bancar prejuízo”, declarou à época ao jornal ATARDE o vice-diretor da faculdade, o economista Edson Pitta Lima.

Os principais problemas foram a falta de alunos e a elevada taxa de evasão. Dos cerca de l. 100 aprovados no vestibular 2006.1 da Polifucs, apenas 197 se matricularam, sendo que 62 deles eram bolsistas. Lima atribuiu a evasão à dificuldade financeira de muitos alunos em arcar com os custos de um curso superior, com livros, xerox e acesso a computador.

Os alunos da Polifiics acabaram sendo transferidos para a Unibahia, instituição vizinha, em Lauro de Freitas. “Há muitos cursos oferecidos e poucos alunos com condições de pagar. O problema é basicamente de renda”, avalia o diretor da Unibahia e vice-presidente da Associação Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), Fabrício Vasconcellos.

Apesar do elevado déficit educacional do País, Vasconcellos considera que as instituições particulares se voltaram para as classes com maior poder aquisitivo, o que limitou o poder de expansão do setor. “Uma coisa é necessidade, a outra, é mercado”

DESACELERAÇÃO – O setor, que desde 97 aumentava o número de alunos matriculados a percentuais superiores a 15%, sofreu uma redução nesse ritmo a partir de 2003, quando a demanda cresceu 7,7%. A desaceleração culminou com os 2% de crescimento em 2004, e os 8,9% em 2005, ano do último censo da educação superior realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão ligado ao Ministério da Educação.

Ryon Braga explica que a aparente retomada do crescimento em 2005 se deve a este ser o primeiro ano de ingresso dos bolsistas oriundos do Prouni, Programa Universidade Para Todos, do governo federal, que fornece bolsas integrais e parciais a estudantes de baixa renda nas instituições privadas. “Se excluídos os bolsistas do Prouni, na verdade, o setor privado da educação superior cresceu apenas 1% em relação a 2004”, frisa.

A abertura de novas vagas, acima do crescimento da demanda e notadamente em cursos da mesma área, elevou a ociosidade de vagas de cerca de 50%, deixando muitas instituições em dificuldades. Braga avalia que a única forma de a demanda voltar a crescer é com a aumento do financiamento estudantil. “Há alunos, o que não há é renda”, define o consultor. No Brasil, onde apenas cerca de 12% dos jovens entre 18 e 24 anos estão no ensino superior, 77,1% do total de estudantes do nível superior está na rede privada.

“Isso leva a uma situação de crise, que não é estrutural, pois ainda há oportunidades no mercado”, pondera Braga. Um estudo elaborado pelo consultor defende que, para uma instituição manter uma vida financeira saudável, cumprindo com as exigências do MEC, ela necessita de 700 a 800 alunos.

Regulação da qualidade do ensino pelo mercado divide especialistas

A expansão do acesso ao ensino superior, principalmente apôs a explosão do número de instituições particulares, facilitou a entrada na universidade mas aumentou o receio acerca de outro tema: a qualidade do ensino.

Para o consultor educacional Ryon Braga, um dos mitos que deveriam ser derrubados é o de que o ensino público seria melhor que o privado. Braga argumenta que a pressão competitiva do mercado estaria levando as particulares a se desenvolverem a patamares superiores às públicas.

“Acredito na regulação (a qualidade) pelo mercado. O problema é que no setor da educação o tempo para a percepção da sociedade é mais elevado”, pondera Braga.

Esse tempo médio é calculado pelo consultor em no mínimo oito anos. Seria o tempo suficiente até que os primeiros formados pela instituição pudessem ter condições de avaliar junto ao mercado a qualidade do curso e de disseminar essa avaliação na sociedade. “A educação superior como setor da economia ainda é muito recente”, ressalta.

MERCADO – A abertura do mercado da educação superior trouxe não só o crescimento das instituições particulares mas também impôs uma mudança qualitativa ao setor, que passou a operar sob a lógica do mercado, segundo avalia o professor Roberto Leher, da Faculdade de Educação da UFRJ e ex-presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes).

Essa mudança, segundo Leher, traz prejuízos à qualidade do ensino, pois a competição pelo mercado seria feita através dos melhores preços, em detrimento da qualidade. “O empobrecimento da classe média está levando a um cálculo pragmático: o que eu posso pagar?”, exemplifica, afirmando que a classe média não tem mais o poder de pressionar o mercado por qualidade.

Segundo Leher, outros países já viveram situações semelhantes à atual, como os Estados Unidos, onde, na década de 40, 55% das instituições de ensino superior eram privadas. Com o aumento das exigências governamentais e a pressão da sociedade por qualidade no ensino, hoje em dia esse número está em cerca de 22%, afirma Leher.

AVALIAÇÃO – Com a implantação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes) a partir deste ano, o consultor Celso da Costa Frauches, do Instituto Latino-Americano de Planejamento Educacional (Ilape), acredita que o governo terá melhores condições de avaliar o ensino superior. O Sinaes analisa, além do desempenho dos estudantes, as instituições e os cursos, através de profissionais do MEC que visitam as instituições.

Para Costa, só daqui a três anos o ciclo avaliativo do Sinaes começará a mostrar a real situação do ensino superior.