Reforma Universitária, greve, nova avaliação, ProUni (Programa Universidade para Todos), expansão das universidades federais. Nos últimos anos, o tratamento dado pelo Governo Federal às necessidades e projetos do Ensino Superior tem sido motivo de discussão e polêmica em variados níveis da sociedade – colocando desde os desejos de estudantes, docentes e pesquisadores até os interesses das forças produtivas do país em pauta na agenda política.

É a escolha dos eleitores no segundo turno que decidirá o rumo a ser dado para essa discussão nos próximos quatro anos. Antes de escolher definitivamente seu candidato à presidência, portanto, pense bem: você sabe o que está em jogo para a Educação Superior nesse momento?

Para entender as expectativas das IES em relação ao próximo mandato presidencial, o Universia conversou com reitores representantes de universidades federais, privadas e o representante dos reitores do país. As esperanças e planos de cada um desses segmentos você confere clicando nos textos abaixo.

“Acredito muito na avaliação institucional e na avaliação do curso. Essa não tem que ser uma política de governo, tem que ser uma política de estado, uma política perene”

Nival Nunes de Almeida, reitor da UERJ (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e presidente do Crub (Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras)

“Temos que pensar como o jovem. Quando você conversa com o idoso, ele passa um dia contando seu passado, uma hora falando do presente e cinco minutos falando do futuro. O jovem gasta cinco minutos falando do passado, uma hora contando suas aventuras e dois dias falando dos planos para o futuro”

Hermes Ferreira Figueiredo, presidente da mantenedora da Unicsul (Universidade Cruzeiro do Sul) e presidente do Semesp (Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior de São Paulo)

“Não defendemos soberania para fazermos o que nos der vontade. Defendemos autonomia com controle social”

Arquimedes Diógenes Ciloni, reitor da UFU (Universidade Federal de Uberlândia) e segundo vice-presidente da Andifes (Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior)

Particulares: hora de mudanças

Para presidente do Semesp, é preciso mexer na estrutura da Educação

Hermes Ferreira Figueiredo é presidente do SEMESP (Sindicato das Entidades Mantenedoras do Ensino Superior de São Paulo) e da Instituição Educacional São Miguel Paulista, mantenedora da Unicsul (Universidade Cruzeiro do Sul).

Em entrevista ao Universia, dirigente fala das preocupações com o sistema privado de Ensino Superior. Confira:

Universia – A partir do contexto atual da Educação Superior, quais são as suas expectativas para o próximo governo?

Hermes Figueiredo – Para o Ensino Superior como um todo, não esperamos grandes mudanças, já que os programas de governo dos dois candidatos não trazem nenhuma grande novidade. O Lula fala a respeito da expansão do Ensino Superior, com foco nas universidades públicas federais, principalmente na área tecnológica. Mas os programas ainda continuam sem novidade quanto ao cerceamento da abertura de universidades privadas.

O Alckmin bate nessa mesma tecla, na expansão dos cursos federais e tecnológicos, além de deixar claro que vai priorizar o Ensino Básico, já que ele acha que existe um desvio de foco para o Ensino Superior. Ou seja, nenhum dos dois candidatos tem um plano de longo prazo para a Educação – só que um fala que sua proposta é ótima, outro fala que a sua é melhor. Não tem nenhuma diferença.

Ninguém apresenta nenhuma mudança na gratuidade das escolas públicas, que no nosso entender é um equívoco, por exemplo. Nos países europeus, quem pode paga para estudar nas universidades públicas, e quem não pode pagar e tem mérito consegue bolsas de estudo. Nosso país não tem capacidade financeira de universalizar gratuitamente a universidade pública. Porque construir o campus é fácil, difícil é promover o custeio das suas atividades, atualizar os laboratórios, contratar bons professores. Nesse sentido, o ProUni (Programa Universidade para Todos) é um projeto bem sucedido, que sai muito mais barato para o governo do que expandir a rede federal.

Universia – Na sua opinião, quais devem ser as três prioridades do próximo governo em relação à Educação Superior?

Hermes Figueiredo – Em primeiro lugar nós esperamos uma medida saneadora das leis que regulam a relação entre as instituições privadas e o governo. Era necessário existir uma comissão que analisasse e simplificasse as leis que regulam o nosso relacionamento com o MEC. A autonomia garantida às IES pela Constituição acaba sendo contrariada quando o MEC nos pede coisas que a lei não exige. Existe um autoritarismo absurdo do MEC nesse sentido, que precisa ser modificado.

Também esperamos que se aperfeiçoe o sistema de avaliação do Ensino Superior, por meio da ampliação da competência técnica do MEC. A avaliação tem melhorado muito nesse sentido. Há até pouco tempo, ela ainda era influenciada por um viés ideológico de muito preconceito às universidades privadas. Seria essencial colocar um representante das escolas particulares nas comissões de avaliação, para contrabalançar esse viés.

E em terceiro, tenho a opinião pessoal de que o governo deveria dar autonomia às universidades federais, que têm uma administração muito engessada. Nos EUA e nos países europeus, os professores das universidades públicas são contratados e demitidos de acordo com o seu rendimento profissional, sendo que aqui ele é um funcionário publico, que só pode ser admitido por concurso. Seria mais vantajoso transformar as federais que estão pulverizadas pelo país em centro universitários e faculdades, para que pudessem se dedicar apenas ao ensino e cortar os gastos com extensão e pesquisa. Essas duas responsabilidades poderiam ser transferidas para uma “universidade nacional”, uma instituição de ponta, compatível com as universidades internacionais, e onde estaria a nata dos pesquisadores brasileiros.

Universia – Quais as suas expectativas em relação aos trâmites da Reforma Universitária no próximo governo federal?

Hermes Figueiredo – A universidade privada, apesar de ter sido muito ouvida na discussão da Reforma, foi muito pouco atendida pelo projeto. No eixo principal, a Reforma não muda muita coisa na educação. Ela continua caracterizando a educação como um bem público, enquanto alguns juristas já explicam que a educação é um serviço público quando executado pelo estado, e uma atividade econômica quando mantida pela iniciativa privada. A educação privada deveria ser livre dentro de duas condições: a autorização e a avaliação. A Reforma mantém um certo cerceamento da liberdade de ensino nesse sentido.

Seja qual for o candidato vencedor, acho muito difícil que ela seja aprovada nos próximos quatro anos. É uma questão muito complexa, que envolve e elite intelectual do país, as universidades, os estudantes e também as empresas, as forças produtivas nacionais. Todo o Congresso vai querer se posicionar. Acho que o Alckmin nem tomou conhecimento desse projeto, é um projeto do governo Lula, que veio de cima para baixo, sendo que o país precisa de reformas muito mais urgentes do que essa, como a tributária e a trabalhista. Na minha opinião essa é uma reforma inoportuna, porque temos problemas mais sérios para resolver antes, e porque ela é apenas um marco regulatório, que não inova nada na Educação.

Universia – Quais devem ser as ações do próximo governo para garantir o cumprimento das metas do PNE (Plano Nacional de Educação) e aprimorar a qualidade do ensino?

Hermes Figueiredo – A meta do PNE é aumentar a porcentagem de alunos de 18 a 24 anos no Ensino Superior de 10% para 30%. É uma meta ousada, que certamente não será alcançada. Não há alunos suficientes no Ensino Médio para alcançar esse número no Ensino Superior. Além disso, todas as corporações profissionais alertam para o número de faculdades existentes, para o fato de que existem mais profissionais sendo formados do que o mercado é capaz de absorver. Imagine como seria se essa meta fosse alcançada?

Existe aí um problema maior do que o problema da educação, que requer um projeto de nação, para garantir a empregabilidade e o crescimento. É preciso antes dar um rumo para o país, saber que áreas da economia vão receber investimento, crescer e produzir, e então a escola estará pronta para preparar pessoas na direção desse plano. Os candidatos deveriam estar mais preocupados em pensar não em políticas de governo, mas em políticas de estado, em planos de longo prazo.