A gerente de propriedade intelectual da Agência Unesp indica o caminho para o desenvolvimento tecnológico do país: constituir uma aliança mais afinada entre instituições de ensino superior e empresas por Paulo de Camargo Na sociedade do conhecimento inovar é a palavra-chave. Mas a inovação não é fruto apenas de insights de gênios: demanda pesquisa, desenvolvimento, escala, estratégia comercial e investimento. Foi nesse contexto que nasceu a Lei 10.973, ou Lei de Inovação, há 10 anos, estabelecendo medidas de incentivo à inovação e à pesquisa científica e tecnológica no ambiente produtivo. Entre os mecanismos então propostos estão os Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs), com o objetivo de promover a interação entre atores que nem sempre souberam dialogar – empresas e instituições de ensino superior. Inspirados nos escritórios de transferência de tecnologia existentes em países desenvolvidos, os NITs espalharam-se pelo país: já são mais de 200, apontando para tendências promissoras, embora ainda existam barreiras culturais a serem vencidas, como conta nesta entrevista à Ensino Superior a engenheira e advogada Fabíola de Moraes Spiandorello, gerente de Propriedade Intelectual da Agência Unesp de Inovação. Ensino Superior: Qual é o papel a ser desempenhado pelos Nits? Fabíola Spiandorello: A universidade não faz inovação. Ela desenvolve conhecimento e forma pessoas, mas quem cria produtos e os coloca à disposição da sociedade são as empresas. Os Nits foram criados para ajudar a universidade na terceira parte de sua missão – a extensão. Ou seja, a transferência de conhecimento produzido nas pesquisas para a sociedade. Uma das formas de incrementar esse processo é promover a interação entre as universidades e as empresas, de forma organizada. Por isso, entre as atribuições dos núcleos está a de cuidar da propriedade intelectual, ou mais especificamente da propriedade industrial – patentes, registros de desenho industrial, registros de programas de computador. A integração entre universidade e empresa no Brasil é marcada por barreiras culturais, como a dificuldade de diálogo e a concentração da pesquisa nas universidades. Isso ainda acontece? Ainda é uma realidade. Antes, a interação entre empresas e universidades não era bem aceita no meio acadêmico. A partir da Lei da Inovação, começou a haver uma maior aproximação. Mas ainda há barreiras culturais. Está se formando aos poucos, por exemplo, uma cultura de propriedade intelectual. Nos Estados Unidos ou no Japão, a iniciativa privada é responsável pelo maior número de depósitos de patentes. As universidades também fazem essa proteção, mas no sentido de organizar a transferência do conhecimento. No Brasil, grande parte dos depósitos de patente não são feitos pelas empresas, porque a geração do conhecimento no país está dentro da universidade. Aqui, vale lembrar, 90% dos doutores estão na academia. Nos outros países, é meio a meio. Isso precisa mudar. O que falta para aprimorar a integração da universidade com as empresas? Há uma série de programas de governo estimulando o fluxo de conhecimento de um lado para outro. Estamos melhorando, mas precisamos ir além, por exemplo, estimulando a integração com as médias empresas. Para que o diálogo seja possível, é fundamental que as empresas tenham uma base, para haver diálogo. Um pesquisador da universidade não vai conversar com o comercial, com a contabilidade da empresa. Não é necessário que a indústria tenha um setor inteiro de P&D, mas deve haver pelo menos pessoas capazes de estabelecer esse diálogo. Uma das primeiras modalidades de parceria com as empresas foram as incubadoras nas universidades. Como está esse processo? As incubadoras são necessárias, embora seja verdade que não se conseguiu dar escala ao processo. Mas é um espaço para estimular o empreendedorismo entre os estudantes. Isso acontece no mundo inteiro, ainda mais em um ambiente profundamente marcado pela inovação. O empreendedorismo tem a ver com um ambiente de agitação intelectual, que envolve diversos atores. Só ter incubados não basta, é preciso ter dinheiro para suas ideias. Há iniciativas interessantes, no Brasil, mas ainda distantes do que ocorre em outros países. Estamos em um momento de mudar cultura ou processos? Estamos em um momento de mudar cultura. Os processos estão na frente da cultura, eles existem e sabemos o que fazer, ainda que seja preciso fazer adaptações. Mas o mais difícil é criar cultura e não só universitária, mas entre os investidores. Aqui, o poder público se organizou mais rápido que a iniciativa privada. São sempre as mesmas empresas com quem conseguimos estabelecer a interação. Mas é preciso começar a envolver as empresas médias, não necessariamente com grandes projetos. Pode ser uma prestação de serviços para auxiliar o desenvolvimento de algum produto ou processo. Existe boa abertura na universidade para isso. Falar de inovação também diz respeito aos investimentos. Há recursos para isso? Este não é um caminho também para que as universidades e instituições de pesquisa recebam recursos privados? Sim, há diversas linhas de fomento na esfera dos NITs, seja de agências federais, como a Finep, como regionais, como a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), em São Paulo, e a Fundação da Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig), em Minas Gerais. Vale lembrar que os núcleos não existem apenas nas instituições públicas; há diversas universidades privadas também se mobilizando, como a Pontifícia Universidade Católica (PUC), o Universidade Presbiteriana Mackenzie e o Centro Universitário da Fundação Educacional Inaciana Pe. Sabóia de Medeiros (FEI). Evidentemente, um dos frutos desse processo certamente é a geração de recursos para a universidade. Mas isso está longe de ser uma proporção significativa, pois depende diretamente da maturidade do sistema de inovação do país.
-
Entrevista: Os atributos da boa governança segundo o IBGC
19 de julho de 2023Confira entrevista de Luiz Martha, gerente de pesquisas e conteúdo do IBGC, para a Revista Ensino Superior.
-
"Ensino híbrido possibilita que IES formem profissionais mais preparados"
28 de setembro de 2021O consultor e professor especialista em projetos de aprendizagem, Paulo de Tarso Barros, conversa com o Semesp na terceira entrevista da série sobre ensino híbrido....
-
Ensino Híbrido: "É importante não engessar o que ainda está em construção"
24 de agosto de 2021Em entrevista para o Semesp, o professor e pesquisador de projetos educacionais inovadores, José Moran, fala sobre sua visão em relação ao ensino híbrido....
-
Ensino híbrido: “Pedagogia precisa sempre preceder tecnologia”
2 de agosto de 2021Em entrevista para o Semesp, o cientista digital Maurício Garcia fala sobre sua visão em relação ao ensino híbrido.
-
Censo da Educação Superior indica que o Brasil perpetua gerações sem acesso ao ensino superior
21 de setembro de 2018Rodrigo Capelato, Diretor Executivo do Semesp, fez uma avaliação dos principais números do Censo da Educação Superior 2017, divulgado pelo Ministério da Educação e Inep....
-
Bom Dia Brasil mostra dados do Semesp sobre egressos
19 de outubro de 2017A matéria traz a porcentagem de alunos formados que usaram FIES e estão com dificuldades em pagar as parcelas
-
Entrevista: António Nóvoa - O lugar da licenciatura
18 de outubro de 2016Pesquisador de educação, professor e reitor honorário da Universidade de Lisboa, António Nóvoa propõe que IES criem “casa de formação docente” e se preocupem com...
-
Fluxo acelerado
7 de junho de 2016Presidente do Conselho Nacional de Educação diz que reforma regimental deve melhorar processo de credenciamento de cursos. Sobre a crise política, diz que CNE pode...
-
De olho no crescimento
25 de abril de 2016Engenheiro de formação, Arlindo Cardarett Vianna, reitor da Universidade Veiga de Almeida, enxerga além das fronteiras nacionais ao pensar no possível aumento nas matrículas de...
-
Novas trilhas
28 de março de 2016ENTREVISTA com Ricardo Henriques | Edição 207 Superintendente do Instituto Unibanco defende ampliação do número de trajetórias para alunos do ensino médio, como forma de...
-
Credenciais sem lastro
16 de fevereiro de 2016ENTREVISTA COM EDUARDO GIANNETII DA FONSECA | Edição 206 O economista e professor Eduardo Giannetti da Fonseca fala dos acertos, equívocos e desafios da educação...
-
A favor da agilidade
5 de janeiro de 2016ENTREVISTA com Paulo Monteiro Vieira Braga Barone | Edição 205 Reconduzido ao Conselho Nacional de Educação, professor da UFJF diz que credenciamento de cursos poderia...