
Encontro Nacional da MetaRed TIC Brasil (Foto: Rafael Marques/Semesp)
Qual o futuro do trabalho? Com essa pergunta como foco, a Metared TIC Brasil realizou, nesta quinta (12), o seu sétimo encontro nacional, no Centro Universitário São Camilo, em São Paulo. Ao longo do dia, vários especialistas e gestores de diferentes setores ligados à educação refletiram sobre os desafios e as oportunidades da inserção da tecnologia no âmbito do trabalho.
O evento contou em sua abertura com falas de Lúcia Teixeira, presidente da Metared TIC Brasil e do Semesp; de Carlos Ferrara Junior, pró-reitor Acadêmico do Centro Universitário São Camilo; Fábio José Garcia dos Reis, secretário da Metared TIC Brasil e diretor de Inovação e Redes do Semesp; e Tomás Jiménez Garcia, coordenador da MetaRed Global.

Tatsuo Iwata, Vice-Presidente Acadêmico da ESPM, falou sobre carreiras em transformação (Foto: Rafael Marques/Semesp)
Carreiras em Transformação
“Como preparar pessoas para a não-linearidade das formações e para um mercado de trabalho que ainda não existe?”, perguntou Tatsuo Iwata, Vice-Presidente Acadêmico da ESPM, durante a palestra “Carreiras em Transformação: mercado de trabalho, Lifelong Learning e os desafios para as IES”. Segundo ele, esse é o grande desafio das instituições de ensino superior atualmente.
“O desafio da educação é acompanhar um movimento cada vez veloz e com perspectivas futuras que ainda não sabemos quais são”, disse Tatsuo Iwata. “Hoje não temos mais um tempo tão marcado de presença nas escolas e no mercado de trabalho. Aprendemos a vida inteira e isso pressupõe saber aprender em um cenário desafiador de transformações assustadoras que colocam em xeque uma série de certezas”, continuou. “É por isso que as IES precisam estar ligadas ao nosso dia a dia e às mudanças da sociedade”.
De acordo com Iwata, vivemos em um mundo cada vez mais interconectado e precisamos olhar para três transformações globais importantes: o surgimento e o uso da IA, o grande elemento assustador do momento; a transição verde que propõe uma mudança para modelos de negócios sustentáveis; e o envelhecimento populacional, com pessoas vivendo mais tempo e com mais capacidade produtiva.
Em seguida, ele listou uma série de competências comportamentais e técnicas que as IES precisam desenvolver em seus estudantes. Entre as competências comportamentais estão: pensamento analítico; criatividade; resiliência, flexibilidade e agilidade; motivação e autoconsciência; curiosidade e aprendizado contínuo; empatia e escuta ativa; liderança e influência; consciência ambiental, etc. Entre as competências técnicas estão alfabetização tecnológica e IA, big data, cibersegurança e cloud.
Tatsuo Iwata apontou em seguida quais as implicações de todo esse cenário para a educação. “A aprendizagem contínua é uma realidade, com novos formatos e modelos. Não necessariamente os cursos mais longos são os melhores, daí aparecem as microcertificações”, afirmou. “Outro ponto é a reformulação dos currículos, integrando competências técnicas e humanas com abordagens mais práticas e baseadas em projetos reais”, acrescentou. “E a formação personalizada, com trilhas de aprendizado adaptadas às necessidades individuais”.
Iwata defendeu a adoção de um modelo de aprendizagem circular como uma nova forma de pensar sobre o desenvolvimento profissional. “As transformações nos modelos de aprendizagem se baseiam em um ciclo contínuo de aprendizado, prática, feedback e reflexão. O aprendizado não é mais linear, mas sim um ciclo constante de desenvolvimento”, finalizou.

Daniel Antonucci, CEO e Co-Founder na CRM Educacional, durante painel sobre “Novas Formas de Trabalhar no Mundo da Tecnologia” (Foto: Rafael Marques/Semesp)
Novas formas de trabalhar
Qual a visão do mercado em relação aos usos da tecnologia? O painel “Novas Formas de Trabalhar no Mundo da Tecnologia” apresentou três diferentes perspectivas para essa pergunta com apresentações de Felipe Dewulf, Principal Architect of CI&T; Ari Amaral, Agile Strategy na área de CIO Office & Productivity da F1rst; e Daniel Antonucci, CEO e Co-Founder na CRM Educacional.
“Há empresas que olham a tecnologia como custo e há aquelas que olham a tecnologia como um investimento e parte do negócio. A tecnologia está misturada aos negócios e faz eles crescerem”, decretou Felipe Dewulf. “Não há mais dissociação entre tecnologia e trabalho, e as empresas estão precisando se reinventar sempre, especialmente agora com a Inteligência Artificial. Nesse cenário, aprender a aprender é uma constante importante”, prosseguiu ele apresentando em seguida os principais usos da tecnologia em sua rotina de trabalho. “Um desses usos é a aceleração da jornada de desenvolvimento, a forma como nós trabalhamos. Nossos times têm trabalhado com mais rapidez e qualidade”.
Ari Amaral falou sobre sua experiência profissional na F1rst e Inteligência Artificial. “A IA não é um fim, mas um meio, mas estamos dando um poder muito maior para a ferramenta do que para as pessoas”, lamentou. Segundo ele, essa lógica vem de nosso próprio modelo educacional em que aprendemos a seguir processos e tomar poucas decisões. “Buscamos eficácia e eficiência para fazer mais rápido e melhor, o que chamo de mindset da eficiência”, descreveu sugerindo um mindset de eficácia, que busca menos a verdade e mais hipóteses em que ferramentas são meios para se chegar ao que queremos.
“Não fomos ensinamos e treinados nas escolas e empresas para fazer análises e tomar decisões, mas sim para seguir padrões. Mas isso não funciona em um mundo onde precisamos se reinventar e aprender constantemente”, avaliou. “Por isso, não precisamos fazer só mais rápido, mas fazer mais rápido do jeito certo. A eficiência, os processos e as ferramentas são um meio, mas a eficácia é o que devemos buscar. A IA, por exemplo, é um acelerador de eficiência, e o que nos diferencia é nossa capacidade de analisar e tomar decisões”.
Daniel Antonucci falou sobre tendências que estão redefinindo carreiras e mercado a partir de três perspectivas: tecnologia; o que as empresas esperam dos profissionais do futuro; e o profissional que está chegando nesse mercado de trabalho, uma geração mais pragmática, rápida e ágil, ansiosa e nativa digital, com consciência ambiental, social e identidades fluidas, cidadãos do mundo etc.
“A IA está tirando o trabalho de nível júnior e de profissionais que fazem operações mais simples que podem ser feitas por comando de voz, por exemplo”, apontou. “O pensamento lógico das IAs é limitado, por isso as competências mais demandas são as comportamentais. As competências técnicas mudam muito rápida, com ferramentas ficando obsoletas muito rápido. Nesse cenário, cerca de 50% dos profissionais atuais vão precisar ser requalificados em um futuro próximo”, finalizou alertando que essa é uma grande oportunidade para as IES.

Enya Costa, pesquisadora do CEPI FGV Direito SP, falou sobre IA na campo do Direito (Foto: Rafael Marques/Semesp)
IA nos setores da educação e jurídico
Enya Costa, pesquisadora do CEPI FGV Direito SP, participou do encontro nacional da MetaRed TIC Brasil promovendo um debate sobre a aplicação prática da Inteligência Artificial nos setores de educação e jurídico, apresentando exemplos de processos e inovações que estão revolucionando essas áreas.
“Como incorporar a tecnologia tanto no trabalho quanto nos currículos em um ambiente tão tradicional como o jurídico?”, perguntou Enya Costa no início de sua fala. “O cenário atual é de competição não apenas entre as empresas jurídicas como entre as soluções jurídicas disponíveis, com o uso de IA generativa no cotidiano dos magistrados. Hoje, a realidade é, inclusive, de incorporação da IA no poder judiciário público”, alertou ela. Segundo levantamento do CEPI FGV Direito SP, mais de 50% dos profissionais já usam IA generativa para análise e resumo de documentos, criação de peças jurídicas e pesquisas de doutrina e jurisprudência.
Enya Costa, em seguida, listou alguns benefícios no uso da IA generativa no Direito: suporte à tomada de decisão, eficiência operacional, identificação de padrões em documentos jurídicos, otimização de recursos e automatização de tarefas burocráticas, etc. Ela citou também questões éticas que surgem junto com esses usos: desinformação, erros e invenções; plágio e invisibilização de autores; privacidade e proteção; vieses e reprodução de discriminação etc. Ela apontou ainda algumas recomendações da OAB sobre a questão: respeito à legislação aplicável, confidencialidade e privacidade, transparência e comunicação de usos e consentimento informado, por exemplo.

Debate sobre uso da IA na área da docência (Foto: Rafael Marques/Semesp)
Docência na era da IA
José Moran, professor, pesquisador e designer de projetos inovadores na educação, Maurício Garcia, presidente do Conselho Acadêmico do Inteli, e Ana Valéria Sampaio de Almeida Reis, membro do Grupo de IA STHEM/SEMESP/MetaRed TIC Brasil, encerraram o evento com uma discussão sobre o impacto da IA na prática docente, métodos de ensino e o papel do professor em um cenário cada vez mais digital e automatizado.
“Há um descompasso entre a evolução tecnológica e a humana”, decretou José Moran. Segundo o pesquisador, existe uma falsa ideia de que a IA é uma ferramenta libertadora, mas ele alerta para a dependência que elas causam. “À medida que os desafios aumentam, as oportunidades são maiores e mais demandam. No campo da docência, ensinar com a IA será um processo cada vez mais abrangente e complexo, flexível, personalizado, colaborativo e tutorial. Ela traz, sim, mudanças profundas, mas em direções diferentes, dependendo dos valores e modelos de cada IES. Cada IES encaixa a IA em seus valores, ela ajuda na direção que a instituição quer”, destacou.
Moran listou alguns usos da IA no ensino atualmente: planejamento de aulas, sugestão de atividades, estratégias, formas de avaliação; resumos e sínteses; aumento nos níveis de personalização; e auxílio nas avaliações e gestão. “Estamos caminhando para multiversidade, com ambientes virtuais imersivos para aprender, experimentar, cria, empreender. Isso com planos de estudo personalizados, flexíveis e com mais itinerários, um design curricular como mapas de transporte, atendendo necessidades e percursos diferentes”, explicou.
“É preciso pensar que nossos alunos vivem realidades diferentes, daí a necessidade de modelos educacionais diferentes”, começou Maurício Garcia. “Também precisamos entender que assistentes pessoais como ChatGPT e outras IAs generativas são diferentes de agentes IA, onde está realmente o grande impacto no futuro dos professores. E pouca gente olha para essa grande mudança. com uma grande quantidade de EdTechs trabalhando em soluções especializadas para diferentes áreas”, prosseguiu.
“Um desafio atual é focar na formação de professores que dominem não apenas uma área, mas saibam uma metodologia pedagógica, engenharia de prompt para entenderem os assistentes pessoais e de programação básica para atuarem com os agentes de IA. Esse é o futuro dos professores”, decretou. “Esses professores precisam ter em mente quem são os alunos que viverão em um mundo cercado pela IA, daí a necessidade de redesenho dos novos currículos para atender um mundo em constante em transformação”, finalizou.
“Os sistemas atuais não preparam estudantes adequadamente para o mercado de trabalho em rápida transformação, impactado pela automação e inteligência artificial”, decretou Ana Valéria Sampaio de Almeida Reis. “Isso é muito preocupante porque precisamos pensar em questões relevantes em relação à profissão docente. Precisamos melhorar as condições laborais da profissão, valorizando o magistério, promovendo o desenvolvimento profissional contínuo e envolvendo esses docentes em iniciativas para combater a escassez”, listou ela.
Para Ana Valéria, apesar dos desafios relacionados à empregabilidade e a uma nova identidade dos docentes, o papel dos professores será transformado. “O professor passa a ser um mentor e facilitador do aprendizado, focando no desenvolvimento do pensamento crítico, criatividade, compaixão e colaboração nos estudantes”, apontou a pesquisadora. “É fundamental também que os docentes ajudem os estudantes a questionarem os conteúdos gerados pela IA, avaliando sua qualidade, confiabilidade e potenciais vieses”, acrescentou destacando a importância de um processo contínuo de alfabetização tecnológica. “Mesmo em um mundo digitalizado, a figura central do professor persiste”.































