Graças à gestão profissionalizada implantada por seu atual presidente, o grupo Estácio avança a passos largos na execução do plano de negócios para se tornar uma das maiores instituições de ensino superior do país até 2020

por Udo Simons | fotos Rogério von Krüger

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A primeira vista, Rogério Melzi impressiona pela estatura. Com 1.91 metro de altura, seus gestos e caminhar assertivo o fazem parecer ainda maior. Outra característica que engrandece a figura do diretor-presidente da Estácio Participações S.A., reeleito para o cargo em abril deste ano, é a simpatia dispensada desde um primeiro contato. É fácil vê-lo com o semblante sorridente para com seus interlocutores. A boa educação é outro predicado. Ao se expressar de forma polida, parece continuamente atento ao que lhe é dito; e tem sempre uma resposta objetiva aos questionamentos. Tais atributos, contudo, não o resumem como profissional. Talvez, sequer sejam os mais importantes.

À frente do grupo educacional desde 2012, tendo antes se destacado em outras funções na companhia (como de diretor financeiro e de relações com investidores e de diretor de operações), esse paulista de São José do Rio Preto tem a missão de colocar a Estácio no caminho para se tornar uma das maiores e mais prestigiadas instituições de ensino superior brasileiras em 2020. Desafio esse que abraçou com confessada alegria, já que ele se revela um “obcecado por metas”. Métrica, aliás, é uma palavra facilmente ouvida em seu vocabulário. “Tudo pode ser mensurável”, afirma.

Vindo do mundo dos negócios, levou para a gestão da instituição a busca por resultados e a aferição contínua das tarefas. “No começo, senti muita resistência. Diziam: ‘educação não é cerveja. Não tente aplicar aqui o que você fez lá’”, numa referência a um dos seus antigos empregadores, a AmBev.

Após seis anos de atuação no setor educacional, o resultado de seu trabalho atenuou resistências. Nesse período, conseguiu revelar as qualidades de se ter uma gestão educacional permeada por práticas modernas de administração corporativa. Agora, olha ainda mais à frente. Quer a Estácio presente em 120 dos maiores municípios do país dentro de seis anos. “Nosso foco são as cidades com 200 mil habitantes. Trabalhamos para abrir, a cada ano, entre oito e dez unidades da instituição nessas localidades”, revela.

Nesta entrevista, concedida à revista Ensino Superior durante os intervalos da realização do VI Fórum de Docentes da Estácio, encontro ocorrido no Rio de Janeiro com a participação de professores e coordenadores do grupo em todo o Brasil, Rogério Melzi fala ainda sobre a nova percepção social do modelo educacional adotado e dos planos que transformam a instituição à base de inovação e de uma gestão profissionalizada. “Há cinco anos, éramos ignorados em vários aspectos pela sociedade e pelo governo. Hoje, essa relação mudou”, diz.

Ensino Superior: Por ser um homem de negócios, o senhor trouxe à Estácio uma gestão mais profissionalizada?
Rogério Melzi: No mundo corporativo, há décadas, emprestamos conhecimento acadêmico, então por que não colocar práticas de mercado e gestão moderna na administração das instituições de ensino superior particulares? Faço um casamento entre práticas que até então viviam isoladas.

Como isso se traduz efetivamente?
Tudo é mensurável. Tudo se transforma em plano de ação na rotina de monitoramento. Aqui dentro chamamos de Gestão de Desempenho (GD). O GD nasceu na Estácio para gerir a Gestão de Desempenho da Operação. Na medida em que a instituição entendeu que poderia utilizar as mesmas ferramentas para fazer outras atividades, nasceu o GDA – Gestão de Desempenho Acadêmico.

O que é o GDA exatamente?
De forma resumida, é a aplicação de técnicas de mensuração, como as ferramentas de gestão para avaliar o Ebitda [o lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização], antes restritas ao CEO ou diretores financeiros, sendo utilizadas para avaliar o modelo de ensino, a satisfação do aluno, o clima entre professores. Ou seja, são os diretores acadêmicos, de ensino, fazendo conferência, reuniões presenciais, com coordenadores do Brasil todo, e questionando as práticas acadêmicas adotadas. É de acadêmico para acadêmico.

O que o senhor quer dizer com “é de acadêmico para acadêmico”?
É que não interfiro. Sei aonde quero chegar, como CEO, mas não preciso interferir em determinados processos, que são os acadêmicos, para alcançarmos nossos objetivos. Para mim, a união da gestão mais corporativa, de regras do mercado, com a visão da academia é uma situação vencedora. A solução dos problemas de educação no Brasil passa muito por aí.

E aonde o senhor quer chegar dentro de um ano, por exemplo?
Na gestão do ensino superior não dá para se fixar no que acontece no próximo trimestre. Em prazos de curto ou médio prazo. É preciso acostumar as pessoas a pensar em longo prazo. Pressa aqui é inimiga da perfeição. Se a gestão focar apenas, ou com muita ênfase, o final do mês ou do trimestre, não se faz um bom trabalho.

Mas a Estácio tem um plano para 2020. Isso implica metas anuais? 
Temos projetos estratégicos para acontecer. São marcos. São métricas incrementais. Traçamos um caminho sustentável para chegarmos em 2020. Não adianta querer ser o MIT [Massachusetts Institute of Technology] brasileiro em 2015. Isso não vai acontecer. Mas posso falar que quero ser a educação de ensino mais inovadora e com mais start-ups em 2020.

Como isso vai acontecer?
Dentro de nosso espaço para inovação, o NAVE. Sua criação, aliás, foi uma das metas fixadas no passado, em 2010. Um dos projetos estratégicos que vimos surgir neste ano. Outro exemplo é nossa Universidade Corporativa, a Educare, planejada há quatro anos. Agora, quero que trabalhemos com pedidos de patentes, de criação de start-ups de alguns alunos, que começam neste ano a criar empresas dentro da Estácio.

Pode-se dizer que a Estácio ainda tem a cara do Rio de Janeiro?
Não. A Estácio tem cada vez menos a cara do Rio. Há seis anos entre 70% e 75% dos alunos eram do Rio. Hoje, esse índice é menos da metade. Nosso maior lucro, atualmente, vem do Nordeste.

A Estácio, então, torna-se definitivamente um player nacional?
Criamos elementos diferenciados para crescer. Onde já estou quero ampliar. Em nossa estratégia podemos comprar, adquirir outras instituições ou termos um crescimento orgânico, construindo novos prédios, ampliando os campi. Fortaleza é um exemplo. Lá, estamos indo para a construção de nosso quarto prédio na cidade.

Qual o melhor modelo de expansão? 
Depende. A Estácio gosta muito de crescer organicamente, sem comprar. Minha preferência é fazer do zero. Assim, já fazemos nossa cultura desde o primeiro dia. Colocamos nossos padrões acadêmicos, entre outros aspectos. Por outro lado, boas aquisições podem trazer para nossos quadros bons profissionais e outros modelos acadêmicos, que, ao se unirem aos nossos, podem gerar boas situações.

Qual o crescimento esperado para atingir a meta de 2020?
Estamos presentes numas 50 cidades, atual­mente. Até 2020, queremos ter presença em 100, 120 dos maiores municípios brasileiros. Cidades com 200 mil habitantes para mais. Essas são localidades que nos interessam. Ou seja, nosso desejo é entrarmos, anualmente, em oito a 10 cidades, seja por aquisição ou expansão orgânica.

E quais são os planos em São Paulo?
Nossa aposta no estado é pelas cidades do interior. Recentemente, entramos em Ribeirão Preto. Na capital, vamos investir num crescimento orgânico. Estamos na capital paulista pela presença do UniSEB.

Em relação a EaD, qual é um cenário atual para esse segmento?
Vivemos um momento gradual de autorizações de novos polos. Aguardamos a aprovação do Ministério da Educação para nossos processos. A UniSEB, por exemplo, nos deu seis polos presenciais na capital paulista. Temos a perspectiva, contudo, de termos, devido à geografia da cidade, uns 16 polos em funcionamento. Internamente, batizamos esse projeto de “barriga verde” e esperamos para o primeiro semestre de 2015 o funcionamento deles. Em termos de longo prazo, para 2020, projetamos forte expansão presencial de nossas unidades de ensino, sendo combinadas com nossos polos de EaD, além da expansão de novos negócios, pós-graduações e soluções corporativas. É como se estivéssemos num grande jogo de xadrez.

Como é seu relacionamento com o Executivo federal?
É de respeito. Há cinco anos a Estácio era ignorada em vários aspectos, menosprezada pela sociedade. A instituição não era articulada. Mas passamos a entender nosso lugar na sociedade e a reconhecer o lugar de nossos interlocutores. Há dois anos, entendemos a necessidade de estar mais perto do governo, por exemplo. De explicarmos mais nossa atuação, o que estamos fazendo pela educação do país. Falo isso não só pela Estácio, mas por todo o setor de ensino superior particular. Hoje me sinto mais respeitado em Brasília.

Até onde a Estácio pode crescer?
Temos aquilo que chamo de “PIB Potencial”. Se eu cresço acima desse PIB, que é um indicador, posso ter problemas graves, “gero inflação”. Estipulamos cinco drives para acompanhar nosso crescimento. Poderia identificá-los como: nossa cultura, prestação de serviço que fornecemos, modelo acadêmico adotado, a formação de liderança entre os colaboradores e nosso sistema de gestão. São indicadores para aquilo que nos interessa acompanhar e, consequentemente, projetarmos nosso crescimento.

O senhor é obcecado por medir tudo?
Sim, é uma obsessão medir tudo. Sou fã do professor Falconi. Ele costumava dizer que: ‘não se controla aquilo que não se mede; e não se gerencia aquilo você não controla’. Do contrário, tudo fica muito empírico.

Como o senhor chegou ao setor de educação? 
Fiz o caminho inverso da maioria dos executivos nesse segmento. Muitas das nossas grandes instituições de ensino são formadas por famílias e educadores que em algum momento começaram a gostar de gestão, de negócio. Sou uma pessoa com formação em negócio que se apaixonou por educação. [Melzi é formado em engenharia mecânica pela Universidade Mackenzie e pós-gradua­do em administração pela FGV/SP e tem MBA pela Stanford University.]

Quais resistências o senhor encontrou?
No começo havia uma resistência a minha pessoa por eu não ter vindo do mundo acadêmico. Diziam: ‘educação não é cerveja. Não tente aplicar aqui o que você fez lá’ [na AmBev, um dos seus antigos locais de trabalho]. Tive de mostrar para as pessoas a funcionalidade da gestão. Da união entre as práticas corporativas com o universo acadêmico. Ao perceber isso, decidi ser o mais educado possível. Ou seja, quanto mais duro tinha de ser mais educado seria.