Ideias colocadas em prática são o motor da mudança e a base do empreendedorismo. O debate já está presente no ensino superior e busca estabelecer os rumos dessa nova ordem para enfrentá-la com sucesso

Inovação é a palavra de ordem nos dias de hoje. Mas para ir adiante é preciso empreender. E o que antes era associado apenas à criação do próprio negócio agora dá sentido à busca pelo conhecimento, pela formação profissional e ao desenvolvimento do país. O empreendedorismo e a inovação estiveram presentes no 14º Fórum Nacional do Ensino Superior Particular (Fnesp), evento cuja cobertura você confere a seguir.

A revista Ensino Superior ainda aproveita o debate para entender os rumos da mudança e saber como enfrentar com sucesso essa transformação, que afeta a educação universitária desde a forma de ensinar até a gestão das instituições. Especialistas e gestores educacionais comentam o que mudou e como o empreendedorismo foi parar dentro da academia. Conheça também os exemplos de instituições inovadoras que implementaram um novo jeito de fazer do ensino superior o motor principal e sustentável para a transformação da sociedade.

Nova cabeça

O mundo mudou e a relação das pessoas com ele também. O avanço da tecnologia, a chegada da geração Y e as novas necessidades de mercado transformaram a busca pelo conhecimento, afetando tanto a escolha dos estudantes quanto o papel das instituições de ensino superior como formadoras dos profissionais para o presente e o futuro.

De acordo com o professor Jorge Audy, diretor do polo de tecnologia da PUC-RS, a transformação no método de ensino das instituições de nível superior no país reflete a urgência surgida na segunda metade do século 20, pós-guerra, efetivamente promovida nos Estados Unidos, Europa ocidental e Ásia, e que só chegou ao Brasil a partir do século 21. Ele aponta que além da pesquisa, que representava o grande mote universitário no início, o empreendedorismo aparece como questão emergencial nos métodos de formação. “A importância do perfil de instrução formal, tanto da parte dos docentes quanto da gestão da academia, se volta a formar alunos com uma atitude mais empreendedora perante a vida”, considera o professor Audy.

Na opinião de Ismael Rocha, diretor acadêmico da graduação da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), o anseio pelo novo surge com certo atraso no país em relação aos outros continentes, mas chega com força, como uma demanda da sociedade moderna. Ele data o ano 2000 como o marco de uma nova orientação dos jovens universitários com relação a sua vida acadêmica e profissional.

Momento propício

Rocha vê o jovem de hoje com um repertório mais crítico e contestador, propício a empreender mudanças. “Ele pensa: ‘eu posso ir atrás da vida que eu quero.’ E percebe que pode criar o próprio negócio, a própria empresa. A universidade, então, tem obrigação de não apenas seguir essa tendência, mas, na verdade, de impulsioná-la”, sugere.
Surge então a necessidade de as instituições de ensino se transformarem a partir de um novo conceito de aprendizagem, que vem da área de negócios, mas que não é prerrogativa da área empresarial, atingindo a formação em qualquer curso superior.

“O importante, para as universidades, é entender que as pessoas passam por um processo produtivo. A instituição não pode pensar apenas em desenvolver profissionais capacitados em determinadas áreas, mas sim preparados para desenhar e desenvolver melhor as suas próprias carreiras. E isso é empreendedorismo”, reflete Juliano Seabra, coordenador de Educação e Políticas Públicas do Instituto Endeavor.

Segundo o especialista, é dever das universidades modernizarem não apenas seus aparelhos pedagógicos, mas também suas políticas de ensino. “Quando se fala em transformação, em geração Y fala-se no processo de desenhar sua própria linha do tempo. Não é necessariamente fomentar, mas mostrar que, além da carreira pública, acadêmica e privada, existe a quarta via, que é construir a própria empresa. Tem muita gente que, em determinada altura da vida, repara que se tivesse contato com empreendedorismo, vivenciado uma experiência, talvez tivesse desenhado a carreira de forma diferente”, argumenta Juliano.

Nas gerações anteriores, na visão de Ismael Rocha, o empreender era ligado aos processos artesanais. “O empreendedor era aquela mulher que fazia doce em casa e aumentou a produção. Aquela que costurava para fora e expandiu. A construção era a partir do próprio esforço. Estrategicamente, não era observado como projeto, mas como algo que deu certo a partir do suor”, explica.

Conceito transversal

Implantar uma formação superior voltada ao desenvolvimento mais acertado dos projetos e aspirações dos jovens profissionais é uma decisão que precisa ser tomada e partir para o envolvimento de toda a instituição. De acordo com os especialistas, o conceito empreendedor não pode ser tratado apenas com um curso, ou uma disciplina, precisa ser transversal.

Segundo Juliano Seabra, os pilares para a implantação do novo modelo de formação devem ser alicerçados progressivamente na parte curricular e com a criação de um ambiente propício para o empreendedorismo (veja quadro abaixo).

Essa linha de raciocínio é compartilhada pelo professor Jorge Audy. No ponto de vista do diretor do polo de tecnologia da PUC-RS, no entanto, cada instituição tem de avaliar qual o melhor método para a sua transição. “O grande desafio se manifesta por uma necessidade de reorganização dos métodos e com a incorporação das mudanças que a sociedade exige. Uma educação superior moderna consegue manter a tradição da qualidade, incorporando as inovações necessárias para atingir as demandas da sociedade. Isso é o que deve ser buscado.”

A transformação também está ligada ao desapego do docente como detentor absoluto do conhecimento. Na opinião dos especialistas, essa metodologia de transmissão por meio do discurso dirigido ao discente e aprofundado nos livros precisa ser mudada. Para Juliano, o papel do docente é ser um agente facilitador e encontrar meios de levar a inovação para a sala de aula, servir de fonte de inspiração e motivar a implementação da ação. “Se o professor tiver a pretensão de fazer tudo sozinho, o ciclo não será completo. Ele tem de ser aberto a interferências, não pode ser o dono da razão”, critica.

Empreendedorismo não tem fórmula certa. Existe o risco, e cada um tem de encontrar a sua forma de atuar, para isso precisa praticar e tomar como exemplo projetos reais. Para que a instituição fuja do ensino considerado tradicional, o aluno precisa ser constantemente municiado com informação e prática ao mesmo tempo, instigado a vivenciar o mundo que está fora das salas de aula.

“É preciso empurrar o aluno para que ele esbarre constantemente nesse mundo, para que possa ter esse tipo de conexão. Os métodos são diversos; cabe à universidade escolher o que melhor lhe convém, desde que não seja apenas um”, indica.

“Esse é um movimento que tem de existir. Ter professor com pé no mercado, com jogo de cintura, trazer gente de fora, experimentar novas possibilidades”, finaliza Ismael Rocha. (Vitor de Oliveira)

O que caracteriza uma instituição empreendedora
Inovadora e moderna
Está preparada para atender às demandas de incorporação de novas tecnologias, se insere nas demandas da sociedade e possui atuação direta no desenvolvimento social e econômico da sua região.Currículo empreendedor
Oferece uma cadeia de disciplinas que conversam com a atividade de criação e desenvolvimento de projetos.

Professores experientes
Docentes com vida profissional ativa, próxima e com experiência no mercado, com perfil facilitador e mentor e não apenas conteudista.

Ambiente inspirador
Promove ações e parcerias para o desenvolvimento de atividades extracurriculares, aulas magnas, feiras de negócios, inclusão de projetos de incubadoras e financiamento de ideias.

Empreendedorismo como prioridade
Aborda o tema de forma transversal em todas as áreas e setores institucionais, tratando o empreendedorismo como prioridade entre gestores e não apenas por parte do corpo docente.