Fábio Reis, diretor de Inovação e Redes do Semesp, e Lúcia Teixeira, presidente eleita da entidade, durante abertura de webinar sobre avaliação e regulação

Diante das rápidas transformações no mundo da educação e dos desafios impostos pela pandemia da Covid-19, os temas de avaliação e regulação estão no centro das discussões da educação, com vários atores propondo alternativas e mudanças nos indicadores de qualidade propostas para avaliar as instituições de ensino superior. Assumindo um importante papel nesse debate, o Semesp realizou, nesta sexta (26), o webinar Avaliação e Regulação: propostas para reorganização do sistema educacional brasileiro, que contou com representantes de expressivos órgãos que estão à frente dessas discussões.

Conduzido pelo diretor de Inovação e Redes do Semesp, Fábio Reis, o webinar centrou o foco do debate na questão da autoavaliação, uma alternativa viável que avalia o sistema do ensino superior a partir de variantes mais amplas do que as atuais formas de avaliação propostas pelo governo federal por meio do Ministério da Educação. “Nosso objetivo aqui é ouvir diferentes pontos de vista para que possamos repensar a avaliação de uma forma mais assertiva e propositiva, valorizando a identidade e perfil de cada IES”, destacou Fábio no início do evento online. “A autoavaliação pode trazer autonomia para as IES”, pontou.

Antes dos debates, o webinar foi aberto pela presidente recém-eleita do Semesp, Lúcia Teixeira, presidente da Universidade Santa Cecília (Unisanta), a primeira mulher a assumir a posição na diretoria da entidade. Lúcia reforçou o interesse das IES por esse debate, lembrando do excesso de burocracia atual que tem emperrado avaliações no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão responsável pela condução das avaliações. “No atual momento de pandemia, por exemplo, é importante considerar uma avaliação remota”, citou reforçando que o Semesp continuará seu trabalho como interlocutor entre as IES e o governo para aperfeiçoar questões ligadas à avaliação e regulação.

Vice-reitora Acadêmica da Universidade Católica de Lisboa, Margarida Mano, apresentou uma palestra “Avaliação do sistema de ensino superior pode melhorar a qualidade das IES e fortalecer a identidade institucional?”

Como melhorar a avaliação do ensino superior

Ex-ministra, deputada Federal de Portugal e vice-reitora Acadêmica da Universidade Católica de Lisboa, Margarida Mano, apresentou a palestra “Avaliação do sistema de ensino superior pode melhorar a qualidade das IES e fortalecer a identidade institucional?”.

Segundo ela, o sistema de gestão de qualidade é fundamental para os cursos, universidades e para o próprio sistema de ensino. “Uma das principais questões em relação à avaliação é como assegurar uma qualidade do sistema de ponto de vista da formalização e, ao mesmo tempo, permitir uma flexibilização que possibilite iniciativa e inovação”, questionou. “A qualidade é fundamental, mas como avaliar a eficácia dessa qualidade sem criar um conjunto de burocracias?”, lançou outra pergunta.

De acordo com Margarida Mano, a qualidade é um fator diferenciador na competitividade entre as IES, mas o sistema de avaliação precisa levar em consideração as assimetrias tanto em relação aos indivíduos quanto às próprias instituições de ensino, buscando sempre a melhoria contínua. Ela pontou ainda que a avaliação do sistema precisa considerar ainda o atual cenário de incertezas causado pela pandemia da Covid-19. “O contexto atual tem gerado impactos econômicos sem precedentes, com fechamento dos campi das universidade e uma adaptação para o ensino remoto”, salientou questionando de que maneira isso afeta a questão da qualidade do ensino e lembrando que esse cenário gera tanto riscos quanto oportunidades.

O diretor Jurídico do Semesp, José Roberto Covac, e a presidente do Conselho Nacional de Educação, Maria Helena Guimarães, durante debate sobre avaliação e inovação

Avaliação e regulação como instrumento de inovação

A presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Maria Helena Guimarães, e o diretor Jurídico do Semesp, José Roberto Covac,  participaram do evento em uma mesa virtual de debate sobre “A regulação como instrumento de incentivo à inovação”.

Maria Helena criticou o grau de burocratização e demora das processos do sistema de avaliação e regulação, lamentando que o Brasil esteja atrasado em suas propostas de mudanças sobre os temas. “Como planejar o futuro do ensino superior diante desse quadro de incertezas atual? As necessidades de mudanças existem e esse debate precisa ser amadurecido”, decretou. “Há poucos anos estávamos debatendo sobre revisão de currículos e qual era o impacto da revolução 4.0 no sistema de avaliação e regulação com o surgimento de novas carreiras, profissionais do futuro e internacionalização. Agora, com a pandemia, essas prioridades mudaram”, afirmou.

Segundo Maria Helena, a autoavaliação é uma alternativa. “O sistema atual está engessado pela burocratização, e a autoavaliação promoveria o fortalecimento desse sistema como um todo”, disse. Ela propôs também uma flexibilização das avaliações para que elas possibilitem a inovação. “Precisamos olhar para frente e construir um painel de indicadores que seja transparente para a sociedade em um sistema livre de pressões políticas e adequado aos desafios tecnológicos, da economia, da globalização e formação de novos profissionais”, finalizou.

Seguindo a mesma linha, José Roberto Covac afirmou que, no atual sistema, a burocracia vem substituindo a própria avaliação e regulação. “É preciso ter cuidado para que a lei não se transforme em uma ditadura, perdendo o verdadeiro sentido e impossibilitando a liberdade para ensinar, o pluralismo pedagógico e a autonomia das IES”, avaliou. “Atualmente, estamos vivendo uma ‘estadania’, com o estado dizendo a todo momento o que as IES têm que fazer”, lamentou.

De acordo com Covac, as IES são capazes, em função do seu entorno e sua missão, de construir projetos de acordo com sua realidade, a partir de normas em conformidade com a realidade social. “O sistema de avaliação e regulação foge do contexto da realidade. Esse excesso regulatório impede que a sociedade tenha autonomia para escolher o projeto que mais atende às suas necessidades”, decretou.

Rodrigo Capelato, diretor executivo do Semesp, Luiz Roberto Lira Cunha, do Conselho da Câmara de Educação Superior do CNE, e Ulysses Tavares Teixeira, da Diretoria de Avaliação da Educação Superior do Inep, durante webinar sobre avaliação e regulação

Avaliação e projeto institucional

A segunda mesa virtual do evento debateu o tema “A avaliação como instrumento de consolidação do projeto institucional” e contou com a participação de Rodrigo Capelato, diretor executivo do Semesp, Luiz Roberto Lira Cunha, do Conselho da Câmara de Educação Superior do CNE, e Ulysses Tavares Teixeira, da Diretoria de Avaliação da Educação Superior do Inep.

Luiz Roberto Lira Cunha começou sua fala registrando a importância do Inep no processo de avaliação e regulação, mas afirmando que o órgão precisa entender os limites que o sistema alcançou e que precisam ser superados. “A avaliação precisa atuar diretamente nas políticas institucionais das IES, não apenas no processo de confirmação regulatória das mesmas. O sistema precisa estimular o desenvolvimento e se libertar de formulários e da burocracia”, defendeu.

Ainda segundo Curi, os indicadores de qualidade precisam ser internalizados pelas IES. Citando o Enade, ele criticou o exame, que perdeu representatividade para as IES e virou um indicador de punição. “A avaliação não pode ser um problema, ela precisa ser uma solução, um processo de estímulo e de desenvolvimento, não um fator limitador”, apontou.

Coordenador-Geral de Controle de Qualidade da Educação Superior da Diretoria de Avaliação da Educação Superior do Inep, Ulysses Tavares Teixeira apresentou uma série de mudanças que a equipe técnica do órgão está montando. “Queremos democratizar ainda mais essa discussão e trazer os atores envolvidos para o diálogo”, contou. “Pelo que tenho ouvido aqui, existe mais consenso do que dissenso sobre as direções das mudanças. Fazer avaliação de todo o sistema de educação superior no Brasil não é fácil. Existe muita disputa sobre os fatores que podem de fato atestar a qualidade da educação e o país possui milhares de IES com missões e estruturas diferentes, todas tendo que ser avaliadas”, citou.

Sobre o Enade especificamente, Ulysses afirmou que a própria existência de uma prova vem sendo discutida e que o Inep tem pensado em formas de achar um ponto de equilíbrio entre as IES e os estudantes em relação ao exame. “Estamos avaliando  mudanças nas provas e na divulgação dos resultados, como uma expansão do ciclo avaliativo, por exemplo. Três anos é um período muito curto para a implementação de melhorias”, avaliou.

Rodrigo Capelato, diretor executivo do Semesp, lembrou que não é fácil trabalhar com indicadores. “Primeiro, existe o risco da criação de um rankeamento, além de que indicadores são sempre imperfeitos e questionáveis, limitando o olhar a um só ângulo. Por isso, nós do Semesp defendemos algo na linha do U-Multirank, algo multidimensional que leve em consideração diferentes contextos, cursos e missões das IES”, defendeu. “É urgente a necessidade de se ampliar o leque de indicadores de qualidade do sistema do ensino superior brasileiro, inclusive considerando a questão da autoavaliação das IES”.

Frank Ziegele e Frans Kaiser, do Center for Higher Education Policy Studies (CHE), apresentam o U-Multirank

O que é o U-Multirank?

Um ranking multi-dimensional que compara o desempenho de universidades nas diferentes atividades em que estão inseridas, o U-Multirank avalia as IES em relação à questões como ensino e aprendizagem, pesquisa, transferência de conhecimento, internacionalização e envolvimento regional. Financiado pela União Europeia, não produz uma classificação individual para cada universidade, nem tabelas classificativas. O U-Multirank atualmente analisa 1800 universidades de 92 países, inclusive o Brasil. Frank Ziegele e Frans Kaiser, do Center for Higher Education Policy Studies (CHE), apresentaram o U-Multirank durante o webinar Avaliação e Regulação: propostas para reorganização do sistema educacional brasileiro.

“O objetivo do U-Multirank é olhar para o desempenho das universidades de forma múltipla”, explicou Frank Ziegele, diretor executivo do Centre for Higher Education (CHE). “Por que e para que precisamos de dados? Não há apenas um lado para medir o desempenho de uma IES. Precisamos de evidências para dar suporte a decisões estratégias e os dados são fundamentais para isso. Não existe a melhor IES. Existe a melhor IES em tal aspecto”, salientou.

Frans Kaiser detalhou sobre a ferramenta online onde as IES podem selecionar outras IES com propostas similares para traçar comparações e obter várias possibilidades de análises de dados.  “É tudo sobre aprendizado, não apenas ranking e transparência, aprendizado ao olhar o que outras IES estão fazendo”.