O mês de agosto marca, de modo geral, o retorno às aulas presenciais. No estado de São Paulo há uma sensação de alívio com a permissão de retorno às salas de aula para 80% dos estudantes.

Nos primeiros meses da pandemia de Covid-19, ouvimos, lemos e discutimos o novo normal. Realizamos eventos imaginando como seria a educação após superarmos a pandemia.

As discussões realizadas em 2020 supunham que o novo normal não seria uma repetição das aulas excessivamente expositivas, com pouco diálogo entre professores e alunos, com pouco aprendizado prático, com pouco uso da tecnologia e realizado entre quatro paredes, com alunos sentados em fileiras. Estes elementos representam um modelo de educação válido, mas talvez seja inadequado para o nosso tempo.

Em nosso imaginário, avançaríamos para um modelo inovador de educação, já que a pandemia iria gerar uma aceleração das mudanças na dinâmica acadêmica e administrativa da IES. Haveria uma mudança de midset dos gestores que, com ousadia, repensariam os modelos convencionais de aula, de currículo e adotariam as novas tecnologias disponíveis.

Professores que tiveram um papel estratégico durante a pandemia seriam estimulados a continuarem se reinventando e os estudantes teriam a oportunidade de experimentar novos aprendizados e vivências memoráveis em sua trajetória de formação.

A dúvida aqui é: este novo normal irá se tornar uma realidade? O que foi imaginado irá se tornar realidade em nossas IES? Os nossos gestores aproveitaram a pandemia para reinventarem suas IES?

Minha hipótese para responder às perguntas: no momento, prevalece uma situação em que o novo normal é revestido do velho normal. Havia e há uma vontade de retornar às aulas presenciais e parece que elas foram retomadas da mesma forma: os modelos das aulas são os mesmos, em sua essência.

O gestor pode se defender e argumentar: investimos em webcam para termos alunos presenciais e remotos ao mesmo tempo. Webcan, sem preparo qualificado do professor, pode ser um “tiro no pé”. Aliás, pode ser um modelo piorado do híbrido, do hyflex ou de qualquer outra metodologia.

Eu gostaria de conhecer exemplos de IES que prepararam seus professores para o retorno da aula, que realizaram um processo de capacitação para aproveitar os aprendizados adquiridos durante a pandemia.

Sem dúvida a prioridade é o retorno às aulas. Precisamos dos alunos na escola, mas continuar com os mesmos modelos, após passar pela pandemia, indica que o gestor não aproveitou a crise para fazer debates consistentes sobre o modelo acadêmico.

Focamos quase que exclusivamente na gestão institucional e nos resultados financeiros, o que é essencial em tempos de crise, mas deixar de lado o planejamento da dinâmica acadêmica pode significar deixar de lado o que é essencial: o estudante e seu aprendizado.

É preciso experimentar novos modelos, como três dias presenciais e dois remotos (ou outros). É preciso definitivamente implementar um ensino baseado em projetos ou desafios, rever os modelos de avaliação e entender o que é de fato ensino híbrido e usar a tecnologia como instrumento de aprendizado.

Parece que ainda fazemos confusão sobre o significado do ensino híbrido. Não basta o estudante ter aula remota e ter aula presencial para afirmarmos que é híbrido. Não basta a aula síncrona ser uma “cópia” mal feita da aula presencial.

Um modelo híbrido precisa de professores preparados, de mentoria, de flexibilização, de interações, de foco na aprendizagem e no perfil do estudante, de tecnologia, entre outros elementos. Necessitamos de uma formação por competências. Qualquer que seja a opção do modelo acadêmico é preciso ter consistência na proposta. O novo normal não pode ser um arranjo mal feito das metodologias de aprendizagem.

Não tenho pesquisa para afirmar que o novo normal é carregado do velho normal. Talvez o velho prevaleça neste momento de transição e de tentativa de entender o que irá acontecer nos próximos meses em relação à pandemia e ao comportamento das pessoas.

Escrevo para manifestar uma preocupação: temo que a frase “tudo como dantes no quartel de Abrantes” se transforme em uma verdade. Temo que entremos em 2022 e, ao olharmos para março de 2020, tenhamos a sensação de que tudo está como antes.

Espero que a coragem e a ousadia, aliadas à capacidade de fazer inovações, prevaleçam na dinâmica das IES. Sim, há IES que ousaram. Conheço reitores que organizaram novos modelos acadêmicos e enfrentaram as resistências internas. Conheço IES que se prepararam para o novo normal.

PS: ao pesquisar sobre a frase “tudo como dantes no quartel de Abrantes”, encontrei um belo artigo do prof. Gabriel Mario Rodrigues. Sugiro a leitura: https://abmes.org.br/blog/detalhe/5634/tudo-como-dantes-no-quartel-de-abrantes. O artigo foi escrito em maio de 2013. O convencional prevalece na dinâmica do ensino superior.

*Fábio Reis, diretor de Inovação e Redes do Semesp, secretário Executivo da MetaRed Brasil e presidente do Consórcio Sthem Brasil.