Enquanto a movimentação no ensino superior continua aquecida com novas compras, vendas e fusões, a saída de investidores do mercado gera rumores e expectativas sobre as tendências para o setor

por Márcia Soligo

Passada uma década do início das aquisições e a posterior abertura de capital das primeiras instituições de ensino superior brasileiras, os ventos podem estar mudando no setor da educação. Pelo menos é o que demonstram as alterações do mercado ocorridas nos últimos meses corroboradas pelas análises de especialistas da área de educação.

As movimentações começaram no início de 2013, com a venda de ações do Grupo Kroton Educacional pelo fundo de privaty equity americano Advent International. O fundo detinha até então 50% de participação na instituição. Também no primeiro semestre deste ano, o fundo de gestão de investimentos Pátria diminuiu sua participação na Anhanguera, passando de 17% para 10,27% o número de suas ações na empresa. E em abril, o Pátria reduziu também sua participação no conselho da instituição.

Mais recentemente, em meados de setembro, o Grupo GP Investments anunciou por meio de comunicado oficial a venda das ações que detinha da Estácio Participações S.A. O GP vendeu 22.064.215 ações, que correspondem a cerca de 7,5% do capital social da companhia, numa transação de US$ 179,1 milhões. A venda aconteceu aproximadamente um mês depois da compra do Centro Educacional UniSEB pela Estácio, em que parte da negociação foi feita com ações, dando a Chaim Zaher, empresário controlador do UniSEB, 6% das ações da Estácio, e transformando-o no maior investidor individual externo da instituição. O empresário também passa a integrar o Conselho de Administração da empresa.

A compra do UniSEB pela Estácio foi uma aquisição significativa, provavelmente em resposta às operações mais agressivas dos grupos concorrentes. No primeiro semestre, a Kroton e a Anhanguera se uniram numa operação que gerou a maior empresa de educação do mundo, avaliada em cerca de R$ 13 bilhões. A fusão ainda aguarda autorização do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), mas já é tida como certa pelo mercado.

De acordo com Sergio Werther Duque Estrada, sócio da consultoria financeira Valormax, o ensino é um setor que permite esse volume de consolidação, o que faz dele um bom investimento para fundos de private equity. Estes fundos se caracterizam por investir em empresas ainda não listadas na bolsa com o intuito de alavancar seu crescimento.

Trajetória de abertura
A precursora da movimentação foi a Anhanguera, que entrou em 2003 para a carteira de investimentos do Pátria, primeira a investir no setor. A abertura de capital da instituição na bolsa veio em 2007. Com a participação do fundo de investimento, o grupo Anhanguera passou de 17 unidades de ensino em 2007 para 47 estabelecimentos em 2008.

Ainda em 2008 o Grupo GP Investments, maior grupo de investimentos da América Latina, comprou uma grande fatia da Estácio de Sá, pertencente à família Uchoa Cavalcanti, fundadora da instituição na década de 1970. Na época, a Estácio era o maior grupo de ensino superior do país e oferecia oportunidades promissoras em um mercado que demonstrava possibilidades de ascensão. A abertura do capital aconteceu em 2009,

Em junho daquele ano, a Advent entrou como investidora da Kroton, comprando 50% das ações pertencentes à holding controladora, a Pitágoras Administração e Participações (PAP) por R$ 280 milhões. Na época, a PAP detinha 55% das ações. Em 2012, foi concluído o processo de extinção do bloco de controle. O valor de mercado da empresa de 2009 até 2013 ficou doze vezes maior, enquanto o preço das ações triplicou.

Com os resultados positivos, aliados às possibilidades de crescimento geradas pelo Fundo de Financiamento Estudantil (Fies) e o aumento de poder aquisitivo da Classe C, o movimento de retirada ou desinvestimento dos grupos pode gerar estranheza. Além disso, players estrangeiros continuam chegando ao mercado brasileiro e buscando espaço, como o grupo americano de investimentos educacionais Laureate, que detém a Universidade Anhembi Morumbi entre outras 11 instituições no Brasil e acabou de adquirir as Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), numa transação de R$ 1 bilhão.

Movimentação estranha
Com a venda das ações da Estácio, a GP Investments embolsou U$$ 56 milhões líquidos. O investimento gerou um retorno de duas vezes sobre o capital investido com as ações vendidas. O desinvestimento chamou atenção, pois veio logo após a aquisição da UniSEB. “Causa certa estranheza. O setor de ensino está sendo considerado quente, pois tem mercado. Contudo, os grupos estão diminuindo suas participações. Por que esses grupos estão saindo quando o setor ainda é promissor? É um caso a pensar”, analisa Duque Estrada.

O ambiente gerado pelo governo brasileiro também é apontado como um dos possíveis motivos da saída dos investidores. Com iniciativas como o programa Mais Médicos, que tem causado polêmica nos últimos meses, investimentos em outras áreas de atenção podem não gerar interesse, pois não é possível saber qual será o próximo setor em que aparecerão medidas impactantes.

Por outro lado, é parte da estratégia de fundos de investimentos desinvestir após um determinado tempo. O fundo permanece enquanto o investimento precisa de melhorias de gestão e consolidação no mercado. Existe um trabalho para aumentar o valor na bolsa e aos poucos ele começa o processo de retirada.

Nesse sentido, o economista Ricardo Amorim acredita que o movimento é esperado e natural. “Esses players têm entrada e saída. O negócio deles não é educação. Eles viram a oportunidade de incrementar o investimento para valer muito mais e, depois disso, sair”, avalia.

Para Amorim, o crescimento educacional no Brasil ainda é próspero e por este motivo os investidores internacionais estão buscando formas de crescer neste mercado. Mas ele também lembra que em breve o governo deve se virar para a educação, como se virou para a saúde, e impulsionar iniciativas que atingirão o setor diretamente.

Ainda que o desinvestimento de capital seja uma movimentação estratégica, estudar as oscilações do mercado é providencial para preparar o solo. Neste caso específico, a desconfiança é gerada também pelo fato de os investidores não explicitarem a vontade de retornar ao setor de ensino, tão lucrativo e promissor atualmente. Resta estar atento às movimentações e aguardar os próximos capítulos.