Ainda sem convergência metodológica – nem de público – com os cursos presenciais, a EAD precisa se valer de estratégias diferenciadas de divulgação para atrair seus estudantes

por Antonio Carlos Santomauro

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Com presença em continuada expansão no ensino superior brasileiro, os cursos de educação a distância ganham estratégias mercadológicas próprias, com as quais as instituições acabam trabalhando de maneira integrada às distintas modalidades ofertadas, como os cursos presenciais ou tecnológicos. A diferenciação, ao menos por enquanto, devido às ainda presentes particularidades do ensino a distância, justificam as práticas de marketing diferenciadas.

Parte significativa dessas especificidades do marketing de EAD decorre de uma informação fundamental para qualquer ação mercadológica: seu público-alvo. Afinal, embora seja crescente a convergência entre os dois contingentes, os cursos a distância ainda conquistam um público relativamente mais velho do que o dos presenciais –, e em sua grande maioria já empregados (veja quadro na página 34). Além disso, há, simultaneamente, diferenciais marcantes no preço, que na EAD é quase sempre mais baixo do que o dos cursos presenciais. Assim, até agora a opção pelo ensino a distância parece fundamentada principalmente em fatores como a conveniência – necessária a esse público que – além de trabalhar pode ter já uma família à qual deve dedicar parte de seu tempo –, e no custo mais acessível.

“Tendo porém todas as condições de escolha, a grande maioria dos alunos ainda optaria pelo ensino presencial”, afirma Carlos Longo, diretor da Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed). Ele qualifica como “cultural” o motivo básico dessa preferência pelos cursos presenciais. “Brasileiros – e latinos de maneira geral – gostam do contato interpessoal”, oberva Longo. “Além disso, alunos que cursam uma graduação a distância – cuja faixa etária é mais elevada –, não pertencem ainda à geração digital, e têm receio natural de mudanças e uso de tecnologias”, ele acrescenta.

O diretor da Abed reconhece também a persistência de alguma desconfiança em relação à qualidade dos cursos EAD, não tanto entre seus potenciais alunos, mas especialmente entre outros públicos capazes de influenciá-los (como os pais de alunos, os quais, muitas vezes, são os responsáveis pelo custeio das mensalidades, ou mesmo a opinião dos empregadores). “Mas essa percepção relacionada à qualidade é cada vez menor, até porque os indicadores do MEC confirmam que na média os alunos de graduação a distância estão obtendo no Enade performance superior à dos presenciais”, ressalta Longo.

Tim-tim por tim-tim

São justamente as possíveis desconfianças levantadas sobre a modalidade que justificam incluir na divulgação da EAD um rol maior de explicações como, por exemplo, sobre a dinâmica de funcionamento, ou mesmo sobre a validade dos diplomas. Na opinião de Guilherme Franco, vice-presidente de marketing e vendas do grupo Kroton, o ensino presencial conta com um diferencial mercadológico capaz de ampliar significativamente os índices de opção por essa modalidade, que é o financiamento estudantil do governo federal, o Fies, até agora não disponível para cursos a distância. Para Franco, porém, já está estabelecida uma trajetória na qual convergem mais e mais os públicos – e assim as estratégias de marketing – dos cursos EAD e presencial. “O jovem familiariza-se cada vez mais com as novas plataformas de ensino, contribuindo para essa convergência”, completa.

Fundamentadas na crescente confluência entre os públicos de ambas as modalidades, instituições de ensino superior desenvolvem projetos integrados de divulgação de seus processos seletivos, nos quais abordam da mesma maneira tanto os cursos com vagas presenciais quanto a distância. É o caso, por exemplo, da rede Claretiano, que pelo segundo ano consecutivo investe numa campanha única, cujas peças de comunicação diferem apenas em informações básicas, como os endereços de unidades – campi ou polos de EAD, dependendo do que oferece em determinada região –, e os dados específicos sobre o modo de operação e a estrutura de cada uma dessas modalidades.

O início dessa estratégia da campanha integrada coincidiu com a implementação, em 2013, de um processo de unificação da identidade visual das diversas unidades da rede, composta por quatro campi e 75 polos de EAD. “Hoje chamamos o aluno para nosso vestibular e ele escolhe qual modalidade melhor lhe convém”, explica Valdinei Oliveira, coordenador de marketing do Claretiano Rede de Educação. “Ainda observo muitas campanhas publicitárias específicas para EAD, mas a campanha única é uma tendência”, prevê.

Da mesma forma trabalha o Centro Universitário Internacional Uninter, que desenvolve uma mesma campanha para divulgar os cursos a distância e presenciais – com o mesmo conceito e os mesmos protagonistas –, com variações apenas pontuais nas respectivas peças. “No começo a EAD propagou-se mais nas regiões onde não havia outra oferta, e entre quem não tinha condições de pagar pelo ensino presencial. Mas hoje mesmo quem tem as duas opções, e pode pagar por qualquer uma delas, considera ambas”, pondera Raul Picler, diretor de marketing do Centro Universitário Internacional (Uninter).

De acordo com ele, sendo o jovem o público prioritário de qualquer instituição, é fácil conseguir rapidamente, via redes sociais, por exemplo, informações sobre o ensino superior, EAD ou a qualidade das instituições. O investimento do Uninter também se direciona, porém, a um composto que além de internet e celular, inclui TV, rádio, jornais, revistas e mobiliário urbano, entre outras mídias, para ampliar a abrangência da realidade da EAD, levando as informações sobre a modalidade também a pais e outros influenciadores da opinião do seu público-alvo.

Aposta na diferenciação

O preço menor – em alguns casos, até 60% ou 70% inferior ao cobrado nos cursos presenciais graças ao ganho de escala –, constitui poderoso diferencial de marketing da EAD. No entanto, a EAD para nichos específicos, e consequentemente a preços menos competitivos, já é uma realidade trazida de experiência em outros países, conforme cita Longo. “Nos Estados Unidos, por exemplo, há MBAs a distância mais caros que presenciais, e muito demandados”, destaca o diretor da Abed. “No Brasil, poucas instituições focadas em nicho já concedem atenção à EAD, mas isso começa a mudar, e mudará ainda mais, até por demanda do público”, observa.

Também não é a escala o foco inicial da Faculdade de Informática e Administração Paulista (Fiap) ao entrar no mercado de EAD. A instituição, que aguarda apenas a autorização do MEC para o oferecimento de cursos a distância, oferecerá a modalidade por em média apenas 20% mais barata que a presencial, mas ainda acima da média de preços dos cursos de EAD em geral, com mensalidade situadas na faixa entre R$ 600 e R$ 700. “Projetamos inicialmente cerca de trezentos alunos de graduação em nosso EAD”, destaca Leandro Rubim de Freitas, diretor de EAD da Fiap. “Pensamos em um público que não quer apenas um diploma, trabalha em cargos mais elevados, busca um conteúdo de maior qualidade e quer enriquecer seu currículo com a marca de nossa instituição”, completa Freitas.

Também a Uninter começa a conceder maior atenção aos nichos para incrementar ainda mais seu já considerável público de EAD, hoje composto por mais de 140 mil alunos atendidos em 443 polos. “No mais recente processo seletivo lançamos 19 pós-graduações – das quais 13 inéditas –, apenas na área desportiva; isso é algo muito segmentado”, destaca Picler.

Nesse vestibular de verão a Uninter abriu vagas para 31 cursos EAD, nove semipresenciais e vinte presenciais. Para o curso de administração, a instituição cobra uma mensalidade de aproximadamente R$ 1 mil no curso presencial, e R$ 279 na EAD. Porém, de acordo com Picler, a escala não é o objetivo único do ensino a distância. Em países como França, Inglaterra e Espanha, onde essa modalidade de ensino é muito tradicional, já se trabalha muito por nichos”, destaca.

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Futuro de opções

Assim como busca atrair mais alunos, o EAD brasileiro precisa tornar mais fiéis aqueles que já atende, pois ao menos no segmento da graduação ainda são bastante elevados seus índices de evasão: em alguns casos, chegam até a 40%, estima Longo, da Abed. “São múltiplas as causas dessa evasão, desde falta de capacidade de administração do tempo do estudante até as dificuldades de acesso e uso de novas tecnologias”, ele pondera.

Para Longo, há, porém, diversas frentes a serem trabalhadas para a redução dos índices de abandono dos cursos: melhoria da prestação de serviços via portal, suporte telefônico e atendimento pessoal nos polos; desenvolvimento de metodologias pedagógicas mais envolventes; participação ativa de docentes e tutores nos ambientes virtuais de aprendizagem; utilização de softwares de aprendizagem adaptativa, entre outros.

Apesar de precisar superar obstáculos como essa elevada evasão, a EAD no Brasil, prevê o diretor da Abed, em futuro não muito distante se consolidará como realidade similar àquela já existente nos Estados Unidos, onde grande parte dos alunos hoje faz a distância ao menos parte das disciplinas de seus cursos. “Quando essa geração mais nova, e mais acostumada ao digital, chegar ao ensino superior essa realidade avançará muito”, projeta.

Freitas corrobora e visualiza um horizonte de convivência entre o ensino a distância e o presencial. “Logo não haverá distinção entre eles, cada vez mais os alunos querem poder combinar as possibilidades específicas de cada uma dessas modalidades”, ele finaliza.

Já para Oliveira, do Claretiano, sempre haverá porém demanda por cursos presenciais. “Algumas pessoas já descobriram não ter perfil para a EAD, e pesquisas mostram ser a vida social também importante no ensino superior”, ele justifica. Mas Oliveira considera inexorável o avanço do ensino a distância, até por ser ele também impulsionado por fatores alheios à vontade dos alunos: por exemplo, quando é esse o formato dos cursos pagos pelas empresas nas quais eles trabalham.

Estudante que trabalha
Segundo o Censo EAD.BR 2013, da Associação Brasileira de Educação a Distância (Abed), é de 94% o índice de alunos de cursos regulamentados totalmente a distância (excluídos os cursos livres e corporativos), que trabalha. Em todas as modalidades – incluindo cursos semipresenciais, livres ou apenas disciplinas EAD –, cerca de 90% estudam e trabalham.