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Presidente do Conselho Nacional de Educação diz que reforma regimental deve melhorar processo de credenciamento de cursos. Sobre a crise política, diz que CNE pode manter posição de “órgão de Estado”

por Mariana Tokarnia

Conselho Nacional de Educação (CNE) pretende tornar mais rápido o processo de credenciamento e recredenciamento de instituições. Isso porque o CNE está passando por uma reforma no regimento interno, diz o presidente do órgão, Gilberto Garcia. A intenção é estabelecer prazos para a relatoria, sob pena inclusive de redistribuição de processo. Também será estabelecida uma hierarquia quanto à natureza dos processos: credenciamentos deverão ser prioritários em relação a recredenciamentos, por exemplo. “Todas essas medidas, somadas, podem representar um encurtamento enorme do fluxo dentro do CNE”, diz Garcia.
O Conselho também atua na elaboração de novos indicadores para avaliação do ensino superior, definidos na Portaria Normativa nº 8, de 28 de abril de 2016, do Ministério da Educação. As discussões ainda estão em fase inicial, mas Garcia prevê que uma proposta esteja concluída até meados do segundo semestre.

Como órgão de Estado, o CNE assume papel estratégico em um ambiente político instável. O Conselho tem dialogado tanto com o Executivo quanto com entidades civis. Reitor da Universidade Católica de Brasília desde 2014, Garcia diz que o Conselho não tem posicionamento político, mas preocupa-se com os cortes já feitos e eventuais novos contingenciamentos que inviabilizem políticas públicas. Leia a seguir a entrevista que o atual presidente do CNE concedeu à Ensino Superior.

Como o CNE está se preparando para o governo Michel Temer?
É um momento oportuno para o Conselho se afirmar como um órgão de Estado. Temos a responsabilidade de manter a tranquilidade, o diálogo, a inteligência, no sentido estratégico, que é exigido no momento, para que possa dar continuidade a muitas das políticas públicas que estão em andamento, principalmente aquelas que exigem a participação efetiva do CNE, com a elaboração de pareceres e resoluções relativos a diversos temas.

Como o CNE se posiciona em relação à crise política e econômica pela qual o país passa?
O CNE decidiu não tomar um posicionamento público nesse sentido. Cuidamos para que as avaliações pessoais fiquem de lado. Há a predisposição de abrir um diálogo imediatamente, em vindo a se confirmar um novo governo. Internamente estamos fazendo os relatórios finais das comissões ativas no CNE relativos a vários aspectos da educação brasileira, por exemplo, convalidação de cursos, diretrizes para as várias áreas do conhecimento, como direito, relações internacionais, publicidade, educação física, isso está continuando do ponto de vista da educação superior.

Quais têm sido as prioridades do Conselho em relação ao ensino superior?
Demos prioridade, nos últimos tempos, aos grandes marcos regulatórios. O de Educação a Distância [Resolução CNE/CES nº 1, de 11 de março de 2016], concluído e homologado, Especialização lato sensu, concluído no início de maio e encaminhado ao MEC. O próximo marco regulatório será o da extensão, que poderá servir de referência aos indicadores de avaliação institucionais, para lançamento de editais públicos ligados ao financiamento da extensão e para avaliação, podendo constar como componente de indicador, um índice da educação brasileira. São três grandes marcos, os dois primeiros concluídos e o terceiro para começar. E além disso, damos continuidade a uma série de reformas de diretrizes curriculares que, na nossa visão, estão ultrapassadas e não adaptadas ao momento, às novas exigências e transversalidades de áreas de conhecimento, como por exemplo as áreas ambiental e de direitos humanos. Além disso, a prioridade é de diálogo próximo com o Inep na reforma dos indicadores como o IGC e o CPC. Também estamos discutindo novos parâmetros de credenciamento e recredenciamento de centros universitários e universidades.

Quais as discussões sobre credenciamento e recredenciamento de instituições?
Por envolverem Inep, Seres/MEC e CNE, a instrução de processo tem seu tempo natural. Isso é objeto de muita reclamação. Passamos por uma reforma no regimento do Conselho, uma comissão está elaborando uma reforma regimental profunda e grande parte do que virá de novo vai atacar a questão do fluxo processual no CNE, o que é uma novidade. Estamos pensando em estabelecer prazos para a relatoria de processos e medidas de correção em caso de demora, por exemplo. Caso um processo demore muito, estará sujeito a advertência ou redistribuição. São ideias que ainda não estão consolidadas, no sentido de auxiliar na rapidez dos processos. Estamos criando um Grupo de Trabalho de técnicos, no CNE, para ajudar no levantamento de dados para subsidiar o conselheiro na elaboração do parecer. Com todas as informações levantadas, o conselheiro vai elaborar seu parecer sem que precise fazer essa pesquisa. Também estamos aumentando o quadro de revisores do CNE. Queremos disciplinar um pouco mais o fluxo. Por fim, estabelecer uma ordem de prioridade da natureza do processo. Credenciamentos de recursos terão prioridade sobre os demais. Depois, outros tipos de processo como convalidação, internato fora da sede, consultas e depois os recredenciamentos comuns.

Quando esse novo regimento começa a vigorar?
Estamos em fase de comissão, isso é plataforma dessa gestão. Queremos que até o fim da gestão, em outubro deste ano, tudo isso esteja concluído.

Como o CNE vê os novos indicadores de avaliação definidos pelo Inep na Portaria Normativa nº 8, de 28 de abril de 2016?
Isso mal começou, o CNE participou previamente dessa proposta antes de sair a portaria, tivemos reuniões prévias com o presidente do Inep [Luiz Roberto Curi] e tivemos um sinal prévio de que o Inep poderia dar continuidade a essa proposta. Propusemos que o CNE tivesse assento no Grupo de Trabalho. O CNE vai se debruçar sobre a nova proposta, a preliminar, de novos indicadores. Uma coisa é ter novos indicadores, outra é saber o que fazer com novos indicadores, onde podem impactar na regulação. Estamos em uma fase, talvez, de substituição dos atuais indicadores. Ano que vem completam-se dez anos do CPC e cumpre-se também um ciclo de autoavaliação do funcionamento desses indicadores. A proposta é reformá-los, tanto conceitualmente quanto matematicamente como componentes que possam refletir melhor a realidade de uma instituição num determinado momento. Até meados do segundo semestre devemos ter uma conclusão de proposta.

Em relação aos cursos de pedagogia e licenciaturas, ainda haverá mudanças? A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) traz algum novo cenário?
Certamente. A discussão da Base vai gerar uma série de consequências. Tanto vai espelhar como vai ser espelhada na questão de formação de professores e produção de livros didáticos. Embora já tenhamos produzido a diretriz curricular para a formação e formação continuada de professores [Parecer 2/2015], ela pode sim ser revista e aprimorada a partir dos resultados e propostas da BNCC.

Podemos adiantar algum ponto?
Ainda não. Estamos em uma fase política de recomposição do CNE, em um compasso até de uma certa cautela porque não adianta começar e depois alterar de forma substancial; atrasa o processo. Em julho vamos ter uma nova composição.

O financiamento da educação é uma preocupação do Conselho?
Isso tem reflexo sim no CNE, mas não é tema de decisão colegiada. Nas reuniões de trabalho, aparece muitas vezes a questão da continuidade de políticas públicas em função de possíveis cortes no financiamento. Há preocupação com a desvinculação de verbas de receita, por exemplo, ligada a investimentos em alguns projetos, e o que isso traz de reflexo concreto às competências do CNE.

Como vê a desvinculação das receitas de estados, municípios e União para a educação prevista em plano do PMDB?
Isso apareceu como preocupação do CNE com a continuidade ou não de investimentos em políticas públicas em andamento. O CNE, Neste momento, pode ter função política, de abrir diálogo com os órgãos competentes em um novo governo, embora não seja nossa competência diretamente como órgão de Estado. Mas, certamente, somos a instância aonde chegam várias dessas consultas, reclamações, como financiamento estudantil. Obviamente, nossa preocupação tangencia o tema do corte de verba porque impacta algumas das políticas que produzimos como regulação, as quais podem não ter efeito mais adiante por falta de financiamento. Muitas delas derivadas do Plano Nacional de Educação, como a formação de professores.

Essa preocupação deve virar um documento oficial do CNE?
Temos evitado notas públicas. Ultimamente apresentamos em audiências públicas no CNE, apenas um comunicado de preocupação com a situação atual de contingenciamento de verbas, com o que isso pode significar no futuro, e com o grau que pode comprometer a continuidade dos projetos, planos e programas ligados à educação brasileira.