Fórum nacional das instituições particulares decodifica a estrutura do ensino superior para auxiliar gestores no cumprimento da formação de alunos sem perder competitividade

por Luciene Leszczynski

Para Ricardo Amorim, o ensino superior também cresce na proporção do crescimento do país

Para Ricardo Amorim, o ensino superior também cresce na proporção do crescimento do país

Competitividade e mudança no DNA institucional foi o tema do 15˚ Fórum Nacional do Ensino Superior Particular (Fnesp), ocorrido nos dias 26 e 27 de setembro, em São Paulo. O termo extraído do campo da genética a princípio causa estranheza ao ser empregado no debate que versa sobre a gestão de instituições universitárias, mas vem em hora apropriada. Com a evolução do sistema de ensino superior, identificar a própria essência é fundamental para valorizar as características positivas e atacar eventuais falhas, garantindo a sobrevivência no exigente mundo do trabalho e competitivo universo do mercado educacional, de perfil cada vez mais diversificado de alunos. Mas afinal qual é o DNA do ensino superior? A decodificação da estrutura institucional universitária foi realizada ao longo do fórum por especialistas nacionais e internacionais ao abordarem os diversos setores que permeiam a gestão do ensino superior. Confira a cobertura do evento a seguir:

Um desafio chamado Brasil
Na abertura do fórum, o economista Ricardo Amorim, colunista da BandNews, apresentador do programa Manhattan Connection da Globo News e presidente da Ricam Consultoria, empresa especializada na antecipação de tendências globais, brasileiras e setorizadas, abriu os olhos para o tamanho do desafio em que as instituições de ensino superior estão metidas. O especialista discorreu sobre o atual mercado mundial, considerando a crise nos países desenvolvidos e o crescimento econômico da China. Blindada por uma política de investimento e produção acelerados para dar conta dos seus mais de 1,3 bilhão de habitantes, a correnteza do forte desenvolvimento chinês levou ao crescimento dos emergentes como o Brasil. De acordo com Amorim, o interior brasileiro passa a ocupar o lugar de protagonista tomando o mercado que gira em torno das capitais, movimento acompanhado também pelo ensino superior. Amorim considerou o Nordeste como a “China brasileira”. Para ele, entre os fatores que ajudaram a alavancar o crescimento daquela região está o benefício do Bolsa Família, recebido por mais da metade da população do sertão, fazendo também aumentar o consumo no interior. Por outro lado, o economista condenou o baixo investimento do país no setor industrial em relação ao elevado consumo. Nesse sentido, Amorim destacou a necessidade de operar um plano para a formação de um novo contingente de graduados que atenda às necessidades do país. Ele lembrou o valor de ter um diploma no Brasil. “É por isso que o negócio de vocês é tão vantajoso nos dias de hoje”, encerrou.

 

Questão de qualidade
O caso da Brigham Young University (BYU) de Idaho, nos Estados Unidos, serviu para ilustrar como fazer mais pelos alunos e para o desenvolvimento da região, no cumprimento da missão da instituição, sem necessariamente precisar despender um grande volume de investimento. “A gente pode falar em investir, melhorar a tecnologia, mas estamos honrando a qualidade?”, questionou Fanton Broadhead, vice-presidente Acadêmico da BYU. A transformação do ensino superior da instituição foi iniciada com a chegada da atual administração, que se inspirou nos princípios do livro Quem mexeu no meu queijo?, de Spencer Johnson, lançado nos EUA no final da década de 1990, contou Fanton.
De acordo com ele, três imperativos permearam o direcionamento da nova gestão, que buscou focar exclusivamente o ensino, deixando a área da pesquisa para ser retomada num outro momento. Em primeiro lugar, centrada em melhorar a qualidade do ensino, a BYU investiu no desenvolvimento de seus colaboradores com foco no aprendizado. Para atender mais alunos, criou um calendário de três “semestres”, ou seja, distribuindo o currículo em três quadrimestres (de janeiro a abril; maio a agosto; e setembro a dezembro); assim conseguiram administrar melhor o tempo e o uso das instalações. Com isso, puderam também garantir custos mais baixos para o aluno e maior retorno para a instituição, elementos que compunham o terceiro imperativo presente na mudança da instituição. O processo de mudança do DNA da BYU-Idaho também inspirou a redação do livro A universidade inovadora: mudando o DNA do ensino superior de fora para dentro, de Clayton M. Christensen e Henry J. Eyring (veja entrevista na edição de maio da revista Ensino Superior no site www.semesp.org.br). A edição brasileira do livro saiu recentemente pelo selo Bookman, do Grupo A Editora.

A busca permanente por uma cultura da qualidade foi salientada por Luiz Fabio Mischiatti, do Instituto de Educação da Universidade de Londres. “Normalmente fazemos pouco porque as pessoas se contentam com pouco e acabamos perdendo competitividade”, alertou. Nesse sentido, o pesquisador sugeriu questionar se alunos estão realmente satisfeitos e tomar cuidado com a síndrome da mesmice. “Costumamos fazer as mesmas coisas que sempre fizemos, adotando pontualmente uma ou outra coisa diferente, mas nunca de fato mudando profundamente.” De acordo com Luiz Fabio, a qualidade está nos detalhes. “Você sempre pode surpreender oferecendo algo mais”, sugeriu. Para ele, uma estratégia de mudança transformacional faz com que toda a instituição desenvolva o seu potencial. Nesse sentido, o especialista indica que cuidar da reputação deve estar no foco de todo processo, passando pelo desenvolvimento da criatividade, resiliência, inovação, atratividade, relevância no seu contexto. “Se queremos ter alguma coisa que nunca tivemos, temos de fazer alguma coisa que nunca fizemos”, desafiou Luiz Fabio.Um fator diferencial
A apresentação de Carlos Alberto Filgueiras, presidente da DeVry Brasil, reforçou o pensamento a respeito da questão da qualidade. Ele lembrou que o setor de ensino superior passa agora por uma fase de diferenciação, o que significa que as instituições precisam buscar seu posicionamento no mercado de acordo com sua especificidade e missão. Ele sugeriu que existem três formas de ganhar esse jogo: oferecendo o melhor produto, melhor custo ou focando a melhor solução. Contudo, é preciso que a mensagem da missão seja traduzida com consistência e esteja internalizada em todos os processos da gestão. Segundo Filgueiras, a internalização da estratégia passa primeiro pela análise do meio ambiente institucional e definição das ações a serem implementadas para então partir para criação das funções específicas necessárias à mudança de cultura e a contratação de pessoas alinhadas à estratégia. “No momento em que se implanta isso na instituição não existe dinheiro que a possa comprar.”

 

Centrando o foco no aluno
Com mais ou menos intensidade todas as apresentações do 15˚ Fnesp focaram o atendimento dos estudantes. Francisco Solano Portela Neto, diretor Educacional do Instituto Presbiteriano Mackenzie, apresentou os resultados da implantação de um setor especializado para o atendimento dos alunos em vias de abandono da faculdade, trancamento ou cancelamento da matrícula. O gestor mostrou que com medidas simples de acompanhamento do aluno foi possível reverter a evasão em 9% de janeiro a agosto de 2013. Segundo Solano, embora o índice possa parecer pequeno, representa para a instituição a cifra de R$ 3 milhões ao ano.George D. Khu, diretor do Instituto Nacional de Resultados de Avaliação da Aprendizagem da Universidade de Indiana, nos EUA, salientou que o esforço para reverter a evasão não é uma iniciativa em simples benefício da instituição, mas também em nome do aluno, pois o objetivo que cerca o ensino superior é justamente a formação completa dos estudantes. George considerou, como tendência global, a chegada ao ensino superior de um número de alunos com perfil cada vez mais diversificado, além de uma quantidade grande de estudantes com níveis de aprendizado diferentes e até menos preparados. Para atender esses alunos, George sugeriu a criação de sistemas de alerta que identifiquem o nível de preparação do estudante já nas primeiras semanas de aula e não somente na avaliação ao final do semestre. Ele ainda recomendou o uso de práticas pedagógicas envolventes, que mantenham a atenção dos alunos.Criatividade para fazer diferente
Entusiasta das mudanças para melhorar a qualidade do aprendizado, Ana Penido, diretora executiva do Instituto Inspirare e do Programa Porvir, ressaltou uma série de elementos que podem ser introduzidos nos programas de ensino para valorizar a formação dos jovens. Entre as tendências apontadas pela diretora, de acordo com o perfil dos jovens e as necessidades mercadológicas impostas hoje em dia, estão a utilização dos Moocs (cursos massivos e abertos on-line) e a personalização do ensino, criando um ambiente que atenda às especificidades de cada aluno. Ana convocou gestores e professores a pensar novos usos para os recursos existentes. “Os laboratórios de inovação das instituições de ensino não deveriam gerar só para fora criando produtos para atender às necessidades de empresas, mas também trabalhar para gerar inovação para dentro da própria instituição”, sugeriu.

 

Em nome da autoavaliação
De acordo com Claudia Maffini Griboski, diretora de Avaliação da Educação Superior do Inep, que apresentou as últimas mudanças nos instrumentos de avaliação do ensino superior, os indicadores de qualidade são construídos a fim de uma consequente mudança, sempre em busca da melhoria do sistema de ensino. “Cada instituição tem uma identidade e o desafio está em identificar isso em cada indicador“, ressaltou a diretora, lembrando a importância do cumprimento do projeto pedagógico institucional. “Os indicadores vão ser avaliados a partir do que consta no projeto“, atentou. Claudia defendeu a exigência do percentual de mestres e doutores nas instituições, lembrando que essa iniciativa também está relacionada à política de valorização dos professores. “Se a instituição não estimula a evolução da formação do próprio corpo docente, é questionável também a sua qualidade”, avaliou. Rogério Menheghini, editor do Ranking Universitário da Folha de S.Paulo (RUF), lamentou que as avaliações ainda não atinjam a máxima fidelidade. Segundo ele, um dos pontos fracos dos atuais sistemas de rankings é justamente o peso da pesquisa. Para isso deixar de ser um problema ele sugeriu dividir as instituições em de ensino e de pesquisa.

 

Apoio na tecnologia
A 15º edição do Fnesp também contou com um espaço dedicado a expositores de soluções para tecnologia na educação. Com presença cada vez mais forte no ensino superior, recursos inovadores e de aplicações simples são utilizados para integrar as informações referentes aos alunos e colaboradores, auxiliando o trabalho de gestores administrativos e acadêmicos. Dentre as soluções apresentadas para o aprimoramento da gestão estava o CampusVue Performance Analytics, um software de business intelligence que disponibiliza um conhecimento profundo do desempenho da instituição. A solução compõe o portfólio de produtos da Campus Management. Outro sistema exposto durante o evento foi o VR Educação. O produto, que segue a linha da marca VR, funciona com um cartão de controle de presença, que possibilita a produção de relatórios auxiliares à administração do campus e retenção de alunos. Techne, Totvs, Digisystem, Ellucian, Desire2Learn, Portal Universitário, Epson, GVDasa, Bradesco também marcaram presença no evento, expondo seus produtos e as novidades no mercado para o ensino superior. Uma arena de soluções tecnológicas da Cisco também estava montada, auxiliando os gestores a visualizar o processo administrativo pelo viés da tecnologia. As soluções apresentadas no local abrangiam as três frentes de trabalho da empresa: escola conectada; segurança no campus; e ecossistema de soluções para sala de aula. Para exemplificar essa última frente, uma pequena sala de aula foi reproduzida no local, que funcionava com o apoio da lousa eletrônica da Smart, uma das empresas parceiras da Cisco no oferecimento dos serviços.