Pedagoga defende que o sucesso do aprendizado está ligado ao entusiasmo do aluno e para que isso ocorra sugere a implantação de um sistema de ensino mais dinâmico e adequado à realidade dos estudantes

Por Patrícia Pereira | fotos: Rogério von Krüger


A eficiência do ensino tradicional, baseado na transmissão do conhecimento do professor para o aluno, já analisada e questionada por diferentes pensadores da educação, ganhou nos últimos tempos um novo revés: a chegada da geração Y às classes universitárias. Para atrair e engajar esses jovens, que cresceram conectados à internet e a todo um mundo tecnológico, imersos em uma realidade cultural mais dinâmica e com acesso a incontáveis fontes de informação, a pedagoga carioca Paty Fonte defende uma aproximação direta entre os mundos da escola e do aluno. O tema é abordado no livro Projetos pedagógicos dinâmicos: a paixão de educar e o desafio de inovar, lançado no ano passado pela Wak Editora, no qual Paty Fonte mostra como tornar a sala de aula mais adequada ao ritmo dos estudantes de hoje garantindo a eficiência do ensino por meio da implantação de projetos pedagógicos dinâmicos. Com o objetivo de compartilhar estratégias, sugestões de atividades e reflexões em busca de uma educação mais atrativa, ela ainda mantém o site que leva o mesmo nome do livro (
www.projetospedagogicosdinamicos.com). Mas afinal, o que são projetos pedagógicos dinâmicos e como torná-los realidade na instituição de ensino? Isso é o que Paty Fonte nos conta na entrevista a seguir:

Ensino Superior: Por que você critica o ensino tradicional, aquele baseado no quadro-negro e no livro didático?
Paty Fonte: É uma prática que não motiva o jovem de hoje. Desde a escola até a graduação superior, as instituições permanecem na mesmice, com um ensino muito massificado, engessado e fragmentado. A falta de estímulo é o principal ponto falho. Em segundo lugar, critico a falta de valorização da opinião do aluno. A reflexão é muito importante, mas o ensino tradicional não leva o aluno a construir sua própria história, seus próprios conceitos e a refletir sobre os diversos temas. É uma metodologia baseada na transmissão de conteúdo, que não valoriza o desenvolvimento da pesquisa e do pensamento crítico. Existem vários grandes educadores lutando contra isso. Ainda há muita resistência, mas acredito que daqui a pouco vai ocorrer um avanço.

Pode-se dizer que o ensino tradicional se tornou defasado por causa das mudanças tecnológicas ou sempre foi uma prática ruim?
Sempre existiram falhas como ser muito autoritário, ouvir pouco o aluno e colocar o professor no posto de detentor do saber absoluto, mas sua prática foi se tornando ainda mais complicada com as mudanças culturais e tecnológicas que tornaram a vida mais dinâmica. Não quero execrar o ensino tradicional e afirmar que não possui pontos positivos. A sistematização do conhecimento, por exemplo, é um deles.

As práticas pedagógicas precisam mudar também no ensino superior?
Claro. O ensino universitário é muito teórico. A teoria é muito importante, mas é preciso fazer um link dessa teoria com a prática. O próprio ensino de pedagogia é muito teórico. Os educadores se formam sem saber como levar para atividades em sala de aula as ideias dos grandes pensadores. A faculdade, quando comparada ao ensino básico, tem a vantagem de levar mais à reflexão e à crítica, mas a parte da prática é muito defasada em algumas áreas, em especial nos cursos da área de humanas, em que persiste a transmissão do saber como forma de decorar o conteúdo para passar, apesar de haver mais reflexão e uma participação muito maior do aluno do que na escola.

Em que consiste a “pedagogia de projetos” defendida no seu livro?
A pedagogia de projetos parte do princípio de que o aluno vai construir o conhecimento junto com o professor e com todos os membros da comunidade escolar. Sempre se parte de dúvidas – dos alunos e mesmo dos professores –, o que chamamos de dúvidas provisórias. Então a turma passa a buscar respostas e soluções, por meio de trabalhos e pesquisas que, além de responder a essas dúvidas, possam contribuir para ampliar o conhecimento e ajudar a comunidade. Na pedagogia de projetos não há uma separação das disciplinas, todas elas são trabalhadas de forma interligada a partir de um tema central. É claro que se pode focar mais o interesse em uma área e depois em outra, mas sempre tentando fazer a ligação entre elas.

O que caracteriza um projeto pedagógico dinâmico?
A primeira coisa é analisar se ele vai ser útil para resolver algum problema daquela comunidade escolar ou da escola em que se insere. Outro fator importante é garantir a interdisciplinaridade e a transdisciplinaridade do projeto. Um terceiro quesito é que o aluno se sinta integrado ao tema e seja participativo, já que é essencial a motivação pela busca de informações. A ideia é responder a dúvidas partindo de um conhecimento prévio do aluno em direção às curiosidades a respeito do tema. Eu ainda mencionaria o envolvimento dos pais e dos funcionários da instituição como um bom indício de que o projeto está sendo bem desenvolvido.

Como os gestores de uma instituição podem avaliar se sua prática de ensino é eficaz ou se deveria mudar?
São muitos os itens e depende da realidade da escola. Mas, de maneira geral, se o gestor percebe que sua equipe está desmotivada, que só reclama do salário e da desvalorização do profissional, ele já pode ter uma forte suspeita de que o ensino vai mal. Professor desmotivado, desacreditado não tem vontade de criar nada, de fazer nada de diferente. Equipe muito parada, refém da mesmice, que repete ano após ano as mesmas práticas, é um indício de que a escola parou no tempo e não traz para a sala de aula as coisas que estão acontecendo por aí. E é importante fazer esse vínculo da escola com a vida, a escola não pode ser um mundo à parte.

Quais seriam os primeiros passos para que uma instituição de ensino adotasse um projeto pedagógico mais dinâmico e capaz de envolver os alunos?
O primeiro passo é estar certo sobre a busca pela inovação, tanto por parte dos gestores quanto da equipe como um todo. Não adianta adotar projetos pedagógicos dinâmicos para chamar a atenção de pais ou da comunidade se eles não funcionarem na prática. A partir de então é preciso promover uma formação continuada dos educadores, que devem passar por um período de capacitação e reflexão, a fim de vivenciar a metodologia plenamente. Conhecer outros projetos desenvolvidos com sucesso também ajuda na resolução de eventuais dúvidas e para transmitir segurança na hora de colocar o programa em prática. Outro ponto importante é criar projetos dentro da realidade da própria instituição ou da comunidade em que ela está inserida. É preciso ter em mente que mesmo após a implantação de projetos pedagógicos dinâmicos não é de um dia para o outro que se vai mudar tudo dentro de uma instituição de ensino. É um processo lento, que vai depender muito da experiência de cada escola, da gestão, do público atingido, do engajamento de cada um etc.

Um ensino mais prazeroso e atrativo está ligado à metodologia adotada pela instituição ou é a postura do professor em sala o principal elemento para isso?
O ideal é que se tenha o envolvimento da instituição como um todo ou não vai funcionar. Mas quando se fala de processos ainda muito enfadonhos, também se deve levar em conta a postura do professor. O aluno percebe quando o professor é mais amigo, mais acolhedor, mais engraçado etc. Muitas vezes o professor é tradicional, mas o jeito de lidar com o aluno cativa tanto que faz diferença no ensino. Mas infelizmente um professor sozinho não consegue implantar um projeto dinâmico. Ele pode trazer sequências mais dinâmicas, atividades mais bacanas, mas para desenvolver um projeto pedagógico dinâmico toda a escola tem de estar envolvida, até a comunidade se for o caso. Quanto mais gente envolvida, mais interessante e mais rico vai ficar o projeto.

Há várias linhas pedagógicas que defendem métodos mais dinâmicos e envolventes – construtivista, montessoriana, waldorf, freiriana. Por que essas práticas não suplantaram o ensino tradicional e se colocaram no lugar dele se, em tese, são mais eficazes?
Acredito que essas linhas não sobressaíram porque a adoção seria difícil. Poderia apontar milhões de outras coisas, mas a verdade é que daria muito mais trabalho. Primeiro: é preciso ter um bom conhecimento, o que exige mais tempo para pesquisar, mais tempo para se dedicar àquele trabalho. E o professor está muito desgostoso da profissão porque é desvalorizado, ganha mal. Dá muito mais trabalho se aprofundar em uma dessas linhas do que pegar um livro, repetir aquilo, botar no quadro para o aluno copiar. A verdade é essa.