MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

INTERESSADO/MANTENEDORA:

Conselho Nacional de Educação

UF:

ASSUNTO: Interpretação do artigo 33 da Lei 9394/96

RELATOR CONSELHEIRO: João Antônio Cabral de Monlevade e José Arthur Giannotti

PROCESSO Nº 23001.000103/97-71

PARECER Nº:

05/97

CÂMARA OU COMISSÃO:

Conselho Pleno

APROVADO EM:

11.03.97

I – RELATÓRIO

Em atenção a solicitação do Presidente do CNE, a quem chegou abundante correspondência para dirimir dúvidas quanto ao ensino religioso na educação básica pública, foram indicados pela CES o conselheiro José Arthur Giannotti e pela CEB o conselheiro João Antônio Cabral de Monlevade para apresentar ao Conselho Pleno um Parecer preliminar, nos termos do artigo 90 da Lei 9.394/96.

Assim reza o art. 33 da Lei 9394/96:

“O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplinas dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, sendo oferecido sem ônus para os cofres públicos, de acordo com as preferências manifestadas pelos alunos ou por seus responsáveis, em caráter:

I – confessional, de acordo com a opção religiosa do outro aluno ou do seu responsável, ministrado por professores ou orientadores religiosos preparados e credenciados pelas respectivas igrejas ou entidades religiosas; ou

II – interconfessional, resultante de acordo entre as diversas entidades religiosas, que se responsabilizarão pela elaboração do respectivo programa.”

Os conselheiros relatores, após pesquisa, discussão interna nas Câmaras e recurso ao pensamento de especialistas, submetem ao Conselho Pleno o seguinte Parecer:

II – PARECER

A separação entre o Estado e a Igreja está configurada no art. 19 da Constituição Federal:

“É vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e os municípios:

1. estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada, na forma da lei, a colaboração de interesse público.”

O art. 210, ao mandar fixar conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar a formação básica comum, abre o espaço, nas escolas públicas, para o ensino religioso. Haveria contradição entre os dois artigos? Ou o art. 210 estabeleceria uma exceção? Não cremos em qualquer destas alternativas. A Constituição apenas reconhece a importância do ensino religioso para a formação básica comum do período de maturação da criança e do adolescente que coincide com o ensino fundamental e permite uma colaboração entre as partes, desde que estabelecida em vista do interesse público e respeitando – pela matrícula facultativa – opções religiosas diferenciadas ou mesmo a dispensa de freqüência de tal ensino na escola.

Como entender, porém, “ensino religioso”?

Segundo uma primeira interpretação, que há tempo se tornou prática nas escolas, com evidentes dificuldades e contradições, tratar-se-ia de assegurar que um professor, fosse lá qual sua crença, desde que tivesse cumprido as formalidades que lhe permitem a docência, passasse a ensinar matéria “religião”, muitas vezes completando, para sua conveniência ou da própria escola, a carga horária de sua disciplina de formação, registro e ingresso.

Pode-se compreender que qualquer pessoa, religiosa ou agnóstica, deva conhecer os episódios maiores da vida de Jesus Cristo e de outros líderes religiosos, e muito do conteúdo de suas mensagens, pelo fato de ter tido acesso à nossa tradição cultural, reforçado pela sua superior escolaridade. Um professor desta matéria – história da religião, antropologia cultural, ética religiosa – seria, como qualquer outro professor, credenciado pelo Estado através de concurso ou outra forma de atribuições de aula. Desse ponto de vista, nunca seria representante oficial de uma das religiões existentes no país.

Conforme uma segunda interpretação, que é a nossa, inferida dos textos legais, por ensino religiosos se entende o espaço que a escola pública abre para que estudantes, facultativamente, se iniciem ou se aperfeiçoem numa determinada religião. Desse ponto de vista, somente as igrejas, individualmente ou associadas, poderão credenciar seus representantes para ocupar o espaço como resposta à demanda dos alunos de uma determinada escola. Foi a interpretação que a nova LDB adotou no já citado art. 33.

A Lei nos parece clara, reafirmando o caráter leigo do Estado e a necessidade de formação religiosa aos cuidados dos representantes reconhecidos pelas próprias igrejas. À escola cabem duas obrigações:

1. Garantir a “matrícula facultativa”, o que supõe que a escola, em seu projeto pedagógico, ofereça com clareza aos alunos e pais quais são as opções disponibilizadas pelas igreja, em caráter confessional ou interconfessional;

2. Deixar horário e instalações físicas vagas para que os representantes das igrejas os ocupem conforme sua proposta pedagógica, para os estudantes que demandarem o ensino religioso de sua opção, não o saber das religiões, que poderá ser ministrado por qualquer professor afeito a tal conteúdo, mas a prática assumida por um representante confessional ou interconfessional.

Esta segunda interpretação impõe algumas definições, em especial quanto ao financiamento desta atividade na escola pública. Mesmo que a LDB não o declarasse, não poderia haver ônus para os cofres públicos, por três motivos:

1. haveria violação do art. 19 da CF que veda a subvenção a cultos religiosos e a igrejas;

b) criaria um tratamento desigual do Estado com relação às diversas igrejas, porque a subvenção seria desproporcional à demanda. Como o professor seria pago por hora curricular de trabalho, um ou dois alunos de uma religião demandariam o mesmo gasto do Estado do que trinta ou quarenta de outra, já que a lei garante a confessionalidade e a opção dos alunos;

c) finalmente, havendo disposição de pagamento pelo Estado, poder-se-ia chegar ao absurdo de o ensino religioso para dezenas de denominações diferenciadas com demanda na escola ser mais oneroso que o ensino de outras matérias com maior carga horária.

Outras questões pertinentes ao ensino religioso de caráter curricular por exemplo, se ele se aplica ao ensino de jovens e adultos ou de quanto deve ser a carga horária e se ela integra o mínimo legal de 800 horas anuais preconizadas pela LDB são matéria de decisão da Câmara de Educação Básica.

No que compete ao Conselho Pleno, concluímos este Parecer reafirmando que, para a oferta do ensino religioso nas escolas públicas de ensino fundamental, da parte do Estado, e, portanto dos sistemas de ensino e das escolas, cabe-lhes, antes do período letivo, oferecer horário apropriado e acolher as propostas confessionais e interconfessionais das diversas religiões para, respeitado o prazo do artigo 88 da Lei 9.394/96, ser incluída no Projeto Pedagógico da escola e transmitida aos alunos e pais, de forma a assegurar a matrícula facultativa no ensino religioso e optativa segundo a consciência dos alunos ou responsáveis, sem nenhuma forma de indução de obrigatoriedade ou de preferência por uma ou outra religião.

Com isso, cremos estar sendo estimulado o respeito à Lei e o exercício da liberdade, e da democracia e da cidadania.

Brasília, 11 de março de 1997

Relatores – Conselheiros José Arthur Giannotti e

João Antônio Cabral de Monlevade

III DECISÃO DO PLENÁRIO

O Plenário do Conselho Nacional de Educação aprova a conclusão da Comissão

Conselheiro Hésio de Albuquerque Cordeiro – Presidente

(HOMOLOGADO EM 17/06/97, PUBLICADO NO DOU DE 17/06/97 – SEÇÃO I P. 12507)

Proposta de resolução referente ao programa especial de formação de Professores para o 1º e 2º graus de ensino – Esquema.