MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

INTERESSADO: Conselho Municipal de Educação de Corumbá e outros

UF: MS

ASSUNTO: Consulta tenso em vista o Parecer CNE/CP 26/2001 que dispõe sobre os programas especiais de Formação Pedagógica de Docentes para as disciplinas do currículo do Ensino Fundamental, do Ensino Médio e da Educação Profissional em nível médio e participação de profissionais habilitados em concursos públicos.

PROCESSO N.°: 23001.000209/2002-39

PARECER N.º:

CEB 04/2003

COLEGIADO:

CEB

APROVADO EM:

11.03.2003

I – RELATÓRIO

Histórico

No Ofício 113/2002/CME, de 24 de Outubro de 2002, o Conselho Municipal de Corumbá relata a realização de concurso público para provimento de cargo de professor de matemática e afirma que portadores de diploma de licenciatura curta foram impedidos de tomar posse, tendo, no entanto, continuado a lecionar na rede pública com contrato precário. Informa ainda que foi realizado concurso para contratação de profissionais para creche, sendo que o edital do concurso incluía a formação em psicologia como passivo! de nomeação e posse. O ofício termina com perguntas acerca da legalidade das medidas adotadas e indaga o que deve ocorrer a partir de 2006 com os professores que possuírem apenas o nível médio, na modalidade normal, participando de concursos públicos inclusive, de acordo com o disposto com o art. 87 da Lei 9394/96 (LDBEN).

Ofício similar é remetido pelo assessor jurídico da Secretaria Municipal de Educação do Recife, Sr. Geraldo Targino Sampaio, no qual ele indaga a provisão legal para a nomeação e posse de Licenciado em Pedagogia, que, no entanto, tendo se formado em 1981 não apresenta a habilitação magistério e indaga sobre atos emanados deste Conselho versando sobre as habilitações da Pedagogia.

O Sindicato dos Professores Municipais de Conceição do Coité, BA, encaminhou ofício em 28 de outubro pp, manifestando dúvida sobre o termo “admitidos”, presente no parágrafo 4º do Art. 87 da LDB, indagando se o termo designa tolerância para com a presença ou se a referência é em relação a possibilidade de participação em concurso público.

Foi feita juntada ao processo do ofício 008115.2003-01, no qual a Secretária Municipal de Educação de Governador Valadares (MG), profa. Sames Assunção Madureira faz indagações sobre a validade dos patamares do plano de carreira, no qual os professores concursados e portadores do diploma de Licenciatura Curta são alocados no Quadro Suplementar e não no cargo de Professor Municipal II, destinado a professores com Licenciatura Plena em cursos específicos, correspondentes à sua área de atuação.

Mérito

Diversos pareceres já abordaram a questão do direito ao magistério aos portadores de certificado de nível médio, na modalidade normal (Pareceres CNE/CEB 15/98, 1/99, 1/2003, 3/2003 e Resoluções CNE/CEB 3/98 e 2/99). Nessas peças fica acima de qualquer dúvida o faio de que o ano de 2007 não traz nenhuma conseqüência para os professores com credencial de nível médio, na modalidade normal.

Uma consulta sobre posse de professores em concurso público já foi respondida por esta Câmara de Educação Básica por meio do Parecer CNE-CEB 26/2000. Lá consta que é comum que administrações públicas façam diferentes exigências a candidatos a concurso público para provimento de cargos de professor. Reconhece-se a necessidade de selecionar candidatos que atendam às demandas atuais da Lei. No entanto, essa necessidade não pode olvidar os direitos de profissionais que apresentam credenciais diferentes das preconizadas pelo atual quadro legal. Há que se contemplar, portanto, um horizonte mais amplo e delinear os possíveis conflitos e soluções cabíveis, na esperança de dirimir as dúvidas objeto das consultas.

Nos termos do Art. 48 da Lei 9394/96 os diplomas de cursos reconhecidos têm validade nacional (quando registrados) como prova da formação recebida por seu titular. Quando a lei define um requisito acadêmico para habilitação profissional no magistério ela estabelece as condições de validade de contratos. O ato jurídico perfeito emana de contratos válidos e gera direito. O Poder Público tem a obrigação de reconhecer a habilitação profissional decorrente de ato jurídico perfeito e que foi incorporado irreversivelmente ao patrimônio pessoal de muitos profissionais.

É de se esperar que a boa parte dos profissionais hoje em exercício tenha como quadro legal de referência a Lei no. 5692/71, a qual, em seu artigo 30, alínea b, instituía a licenciatura de curta duração. No artigo 40, a mesma lei estipulava como requisito acadêmico para o exercício de magistério o registro profissional expedido pelo MEC. Portanto, nesse quadro de referência, os portadores de registro profissional de professor expedido pelo MEC têm assegurada a ministração das disciplinas constantes naquele documento, ainda que em caráter precário, direito adquirido que não é facultado a nenhuma lei revogar.

De fato, no TÍTULO II, Dos Direitos e Garantias Fundamentais, da Constituição Federal, o CAPÍTULO I se refere aos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, e em seu artigo 5º , afirma:

“XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada; ”

As pessoas que foram legalmente habilitadas para o exercício do magistério por força de aro .jurídico perfeito têm assegurado o reconhecimento de seu título profissional por toda a vida, tendo incorporado irreversivelmente essa prerrogativa a seu patrimônio pessoal, não podendo ser impedidos de exercer a profissão docente na esfera da habilitação específica na forma da lei. Outro preceito importante em relação ao direito adquirido se refere ao fato de ele ser incorporado mesmo se não exercido. Assim, não são apenas os professores que estão no exercício da profissão que têm direito adquirido, mas todos aqueles que têm o certificado de conclusão ou diploma, no caso de educação superior, expedido por instituição reconhecida pelo respectivo sistema de ensino.

Todos os profissionais da educação que adquiriram a prerrogativa do magistério podem, de forma legal, participar de qualquer mecanismo de acesso a funções docentes, em especial na esfera do serviço público. O concurso público de provas e títulos é genuinamente o mecanismo de acesso consagrado em nossa Carta Magna (art. 206, V), com a redação da Emenda Constitucional 19, de 04/06/98). A LDBEN, também ressalta a importância do concurso público de provas e títulos (Art. 67, I), franqueado a todos os que estão legalmente habilitados, como via única de acesso a cargos docentes. A LDBEN chega a ser inclusive incisiva nesse ponto dado que o Art. 85 diz que qualquer cidadão habilitado com a titulação própria poderá exigir a abertura de concurso público de provas e títulos para cargo de docente de instituição pública de ensino que estiver sendo ocupado por professor não concursado, por mais de seis anos. A expressão “titulação própria” tem o fito de explicitar a abrangência que a formação docente comporta e que está definida no art. 62 da LDBEN.

Firma-se aqui, portanto, um importante conceito: a Lei 9394/96 não pode, em nenhum tempo, impedir nenhum profissional da educação legalmente habilitado de participar de concurso publico e a seu pretexto não podem ser cometidos quaisquer atos contra o efetivo exercício profissional de professores com a titulação própria.

O parecer CNE/CES 630, de 05/11/97, ratificou o fato de que as licenciaturas curtas não mais conferem habilitação docente, dado que os futuros egressos dos cursos de curta duração não poderão lecionar nos sistemas de ensino. Note-se o tempo verbal futuro extraído dos termos literais do parecer. A Resolução CNE/CES 02/99, publicada no Diário Oficial da União, em sua edição de 25 de maio de 1999 (Seção l, p. 15) ratificou a extinção dos cursos de licenciatura de curta duração. Portanto, os ingressantes nesses cursos de curta duração, a partir desta data, não estão habilitados profissionalmente face ao quadro legal que lhes serve de referência. Por outro lado, os profissionais que, devido a leis anteriores, possuem registro profissional expedido pelo MEC, têm seus direitos adquiridos preservados pela Constituição Federal e constituem quadro em extinção, ou seja, tiveram habilitação profissional originada de ato jurídico perfeito, portanto inquestionável, mas a via de acesso utilizada à época foi extinta.

A figura do “quadro em extinção” é distinta do “quadro extinto”, e os direitos adquiridos pelos profissionais devem ser respeitados, mantendo-se a referência legal que vigeu à época da outorga da credencial, mesmo que a norma tenha sido posteriormente revogada. Embora a Portaria Ministerial 524, de 12 de Junho de 1998, tenha revogado a Portaria 399, de 29 de Junho de 1989, a forma objetiva pela qual nela eram definidas as disciplinas que os portadores de diferentes diplomas poderiam ministrar permanece servindo de referência para muitos profissionais formados àquela época. Devido ao fato de sua revogação não ter sido acompanhada de nova norma, muito do que ela dispunha permanece como referência em diversos contextos. Mais recentemente, os órgãos normativos de diversos sistemas têm utilizado essa antiga norma, adaptando-a na redação de atos que dispõem sobre professores habilitados a ministrar as disciplinas oferecidas nas escolas de sua circunscrição.

Os sistemas de ensino têm à sua disposição professores com diploma de nível médio e de licenciatura plena, ao lado de portadores de diplomas de licenciatura de curta duração (como parte de quadro docente em extinção). Estes últimos, como ficou bem estabelecido no Parecer CNE/CP 25/2002, não podem ser considerados plenificados por meio do disposto na Resolução CNE/CP 02/97. Da mesma forma como a Resolução CNE/CP 02/97 não confere direito adquirido no caso da plenificação de Licenciaturas Curtas, também não o confere a profissionais que não detinham sólida formação teórica na área na qual buscaram complementação pedagógica, pois também não satisfizeram as exigências do quadro legal de referência. Nesses casos, o contrato entre as partes carecia de validade e não configurou ato jurídico perfeito.

Cabe aos sistemas de ensino priorizar aqueles que, na forma da lei, mais contribuam para a causa da qualidade na educação por meio de normatização complementar, de acordo com o que dispõe o Art. 211 da CF e Art. 10 e 11 (entre outros) da Lei 9394/96.

Assim, o Parecer CNE/CEB 26/2000 registra:

“Como o acesso ao cargo docente na rede pública tem como via única o concurso público de provas e titulas (CF, art. 206, V, LDBEN, art. 67, I), é lógico supor que os professores que se submeterem a concursos públicos terão seus títulos avaliados, quando será aquilatado o valor relativo de cada titulo apresentado, inclusive os obtidos em programas de desenvolvimento profissional. É do interesse do profissional em particular, esteja em efetivo exercício ou não, e da educação em geral, que tais programas sejam implementados pelos sistemas de ensino.

Ao realizar concursos públicos para cargos docentes, as administrações públicas devem atentar a essas disposições legais e, ao mesmo tempo, ao interesse maior da educação. É da dicção do texto constitucional que a educação, obrigação do Estado, deve ser de qualidade (CF, art. 206, VII). Portanto, os professores devem ter seus títulos avaliados, quando do ingresso na carreira docente, seja por concurso ou seleção pública, no interesse maior da educação. Assim, os editais para concursos públicos devem prever a participação de profissionais que estejam em conformidade com a legislação atual, satisfazendo exigências mínimas, bem como a de profissionais que não as possuem, mas têm direito adquirido por terem satisfeito, sob outras legislações já extintas, os requisitos então exigidos. Caberá ao certame de títulos a valoração relativa pertinente, podendo conferir valores diferentes às diferentes modalidades de formação, inclusive diplomas não mais expedidos atualmente (licenciaturas curtas), mas que conferiram a seus portadores, à época, direito à docência.

Editais de concursos públicos que não prevêem a participação de profissionais do quadro em extinção e que não antecipam as regras do certame de títulos, contribuem para a instauração de conflito de interesse. De um lado, profissionais com legítimo direito adquirido pleiteiam participação na disputa mesmo que o edital não a permita. Como vimos, não há amparo legal para deixar de reconhecer o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Por outro, o órgão público quer selecionar os candidatos com as melhores credenciais consoante a Lei. Portanto, os dois lados estão de acordo com ditames constitucionais. A proibição de participação de profissionais do quadro em extinção fere um dos direitos fundamentais do cidadão: da mesma forma, o órgão público não pode esquivar-se de garantir padrão de qualidade à educação, buscando os profissionais mais bem preparados.

A solução possível é a de prever o certame de títulos, com regras claras, definidas antecipadamente, como parte integrante do concurso público que, como vimos, deve ser de provas e títulos.

Dessa forma, editais de concursos públicos devem conter uma parte referente ao certame de títulos, no qual serão aquilatadas as diferentes credenciais apresentadas e sua validade, segundo os quadros legais de referência.

Caso o edital não preveja a participação de algum tipo de profissional legalmente habilitado, os cidadãos que se considerarem lesados devem, antecipadamente à realização das provas, pleitear o direito de inscrição, na forma legal, por requerimento especial ou, se não respondido ou denegado, por via judicial. Assim, registrando o fato de o possuidor ter credenciais distintas das previstas no edital, ele deixa claro que não cumprirá literalmente todos os itens do edital, mas assume compromisso com o conteúdo de seu pleito, apresentando a credencial que declara possuir.

Os profissionais que não tiverem pleiteado à época própria o direito de participação no concurso, não poderão fazê-lo após sua realização. Para atos de nomeação e posse a autoridade competente, no exercício de sua função pública, está compelida a exigir as credenciais solicitadas no respectivo edital previamente à realização das provas, qual sejam, as que implicitamente ou explicitamente os candidatos declararam possuir, inclusive em petição específica.

No caso específico da consulta do Conselho Municipal de Corumbá, o edital do concurso não contemplava a participação desses profissionais, mas ela não foi expressamente demandada. Portanto, a vedação foi aceita de maneira implícita e, assim, a posse não pode ser consumada. Neste caso, não houve ofensa a direito adquirido, portanto, não há direito a reparar e nada há de estranho na constatação de esses profissionais, impedidos no ato de posse, atuarem no magistério a título precário. Trata-se de quadro em extinção, que abriu mão de um direito legítimo ao se abster de requere-lo anteriormente à realização das provas de um concurso público.

Em relação ao Parecer CNE/CP 26/2001, também alvo de pergunta, cabe reafirmar seus termos, em especial na possibilidade de normalização do certame de títulos que devem acompanhar os concursos públicos.

No caso da consulta da Secretaria Municipal de Educação de Recife, deve-se investigar se o profissional foi habilitado profissionalmente à época própria como resultado de ato jurídico perfeito, irrespectivamente ao atual quadro que rege a matéria.

No caso da consulta realizada pela Secretaria Municipal de Educação de Governador Valadares, trata-se de verificar se os professores com diploma de Licenciatura Curta podem ser mantidos em enquadramento funcional distinto daquele dos profissionais com licenciatura de graduação plena. Coerentemente com o exposto acima, deve-se garantir o exercício profissional a todos os professores legalmente habilitados, mas as carreiras ao magistério devem incentivar e reconhecer por meio de progressão funcional aqueles que mais contribuem para a causa da qualidade da educação básica. Assim, há provisão legal para a criação de categorias funcionais diferenciadas, de acordo com as credenciais que os diferentes profissionais apresentam. Aos portadores de diploma de licenciatura curta deverão ser oferecidos cursos que lhes permitam a obtenção da credencial de graduação plena e, assim, poderão progredir na carreira do magistério.

II – VOTO DO RELATOR

Voto nos termos deste parecer, de maneira que os sistemas de ensino não deixem de reconhecer nenhuma das credenciais dos profissionais da educação. As credenciais que decorrem de contraio válido segundo o quadro legal de referência são fruto de ato jurídico perfeito e geram direito adquirido. Os diplomas de Licenciatura Curta devem ser considerados válidos, contanto que o ingresso não tenha ocorrido depois de 25 de Março de I999 e não é considerada válida sua “plenificação” por meio de cursos de complementação pedagógica. Solicito remessa de cópia deste parecer aos interessados. Diante da relevância da matéria para os sistemas de ensino, solicito remessa deste parecer aos Conselhos Estaduais de Educação, por meio do Fórum Nacional dos Conselhos Estaduais de Educação e às Secretarias Estaduais e Municipais de Educação, por meio do Conselho Nacional de Secretários de Educação (CONSED) e União dos Dirigentes Municipais de Educação (UNDIME).

Brasília(DF), 11 de Março de 2003.

Conselheiro Nelio Bizzo – Relator

III – DECISÃO DA CÂMARA

A Câmara de Educação Básica aprova o voto do Relator, com voto contrário do conselheiro Arthur Fonseca Filho.

Sala das Sessões, em 11 de Março de 2003

Conselheiro Carlos Roberto Jamil Curv – Presidente

Conselheiro Nelio Marco Vincenzo Bizzo- Vice-Presidente

DECLARAÇÃO DE VOTO

Voto contrariamente ao presente parecer, tendo em vista que o mesmo aborda questões para as quais o Conselho Nacional de Educação não tem competência para decidir.

Brasília, 11 de marco de 2003

Arthur Fonseca Filho- Conselheiro

Consulta tendo em vista o Parecer CNE/CP 26/2001, que dispõe sobre os programas especiais de Formação Pedagógica de Docentes para as disciplinas do currículo do Ensino Fundamental, do Ensino Médio e da Educação Profissional em nível médio e participação de profissionais habilitados em conc. públicos