O ministro da Educação, Fernando Haddad, está dando uma lição de planejamento ao resto do governo. Seu Plano de Desenvolvimento Educacional (PDE) tem metas bem definidas, critérios de aferição de resultados, mecanismos de ajuste e propósitos claros em relação ao desenvolvimento econômico e social.

É mais que um plano setorial porque situa a educação num quadro amplo de modernização do País. É ainda uma promessa. Sua execução dependerá da ação legislativa, da alocação regular de recursos orçamentários e, naturalmente, de um trabalho gerencial complexo e de muita habilidade política. Mas os primeiros passos são entusiasmantes. A idéia básica é simples e realista: é preciso investir no aprendizado e valorizar, durante algum tempo, principalmente a formação básica e a preparação profissional. A universalização estatística não basta. Foi importante ampliar o número de crianças e jovens matriculados, mas pouco se fez, até agora, para dotar os estudantes de conhecimentos indispensáveis e de capacidades necessárias a uma vida produtiva. Tudo isso parece óbvio, e talvez seja. Mas o plano é inovador, para o Brasil, precisamente por valorizar objetivos simples e práticos. Como primeira função, a escola deve treinar o aluno para ler, escrever e resolver problemas aritméticos básicos, além de prepará-lo para absorver as noções elementares de ciências. Deve dar-lhe a oportunidade, na etapa seguinte, de escolher entre uma formação profissional e o prosseguimento do estudo em nível superior – se possível, conciliando os dois caminhos.

O professor Amartya Sen, ganhador do Nobel de Economia, fala na criação de capacidades como forma de promover ao mesmo tempo o crescimento econômico e a liberdade individual. Um plano realista de formação básica é o instrumento mais adequado nas condições brasileiras. Tudo isso foi esquecido no Brasil durante muito tempo. Nesse período, uma porção de países subdesenvolvidos seguiu o caminho mais óbvio e talvez menos charmoso.

Parte importante do sucesso de economias como as da Coréia, de Taiwan, de Cingapura, de Hong Kong e da Tailândia é explicável por essa escolha. No Brasil, gastou-se muito tempo com discursos bonitos e equivocados sobre a democratização da universidade. Mas só um sexto dos estudantes chega às faculdades e isso não se deve meramente ao caráter discriminatório do ensino superior. A conspiração das elites contra o ingresso dos pobres, negros e índios nas universidades tem sido uma das fantasias do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Isso explica, em boa parte, os equívocos da política educacional no primeiro mandato. O PDE representa uma guinada em relação a esses equívocos. O plano é parcialmente inovador, também, por envolver o governo federal na solução dos problemas do ensino fundamental. Parcialmente, apenas, porque esse envolvimento ocorreu, embora em grau menor, durante a gestão do ministro Paulo Renato Souza, no governo de Fernando Henrique Cardoso.

De certa forma, o PDE retoma e aprofunda a orientação esboçada naquela fase, definindo novas metas, criando critérios qualitativos, estabelecendo mecanismos de controle de resultados e adotando um sistema de recompensas de acordo com o desempenho. Há riscos, naturalmente. O ministro tem-se mostrado realista e não parece propenso, por exemplo, a tomar a informatização das escolas como um objetivo central. Pode-se falar em risco porque a idéia de espalhar pelas escolas computadores de baixo custo parece fascinar o presidente Lula. Os possíveis fornecedores do equipamento estimulam, naturalmente, esse fascínio. Mas a maior parte das tarefas básicas da educação é perfeitamente realizável com quadros, cadernos e manuais de qualidade. Converter a distribuição de computadores em elemento central do programa pode simplesmente desviar esforços do objetivo principal. Computadores quebrados depois de pouco tempo de uso serão previsíveis desculpas para o descumprimento das tarefas. Há mais de quatro anos o presidente Lula e vários de seus principais auxiliares falam na recuperação da política industrial, na promoção da pesquisa e, de modo mais amplo, na revalorização do planejamento.

O resultado prático desse discurso é menos que pífio. A concepção do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), uma justaposição malfeita e sem noção de prioridade de velhos e novos projetos, foi apenas mais uma caricatura de planejamento. O contraste com a ruindade do PAC torna mais evidentes as virtudes do plano educacional.