Representantes da Unesco e da OCDE discutem papel das IES no desenvolvimento sustentável (Foto: Semesp/Juliana Freitas e Luiz Kagiyama)

Em um cenário onde questões ambientais e de diversidade têm sido negadas por grandes lideranças mundiais, a partir da visão macro de duas grandes organizações mundiais (UNESCO E OCDE), o painel “A Educação como aliada do planeta: como as IES podem (e devem) liderar a transformação sustentável” abriu as discussões do 27º FNESP nesta quinta, 26, no Distrito Anhembi, em São Paulo. Yuma Inzolia, chefe de Formação e Desenvolvimento de Capacidades na UNESCO IESALC, e Deborah Nusche, líder de projeto da OCDE, discutiram quais os papéis das instituições de ensino superior no desenvolvimento de estratégias sustentáveis e de engajamento para que o tema volte a ser central no âmbito político e social. A conversa foi mediada pelo colunista da Folha de S. Paulo, Marcelo Leite.

Yuma Inzolia, da UNESCO IESALC, abriu sua fala alertando que a sociedade tem um compromisso em construir um mundo mais justo e equitativo, defendendo que eventos como o FNESP funcionam como um espaço de construção de diálogos necessários para o fortalecimento dos objetivos de desenvolvimento sustentável. “Estamos discutindo aqui um tema que afeta o  mundo em que vivemos e, consequentemente, todos nós”, decretou ela. “Precisamos discutir soluções para mitigar as questões das mudanças climáticas, e acredito que o Brasil está na fronteira desse processo e à frente de mudanças no reconhecimento dos processos de devastação gradual na região. “Esse processo de degradação contínua terá um imenso um impacto não só econômico, mas também social.  Precisamos trabalhar nossa resiliência para mitigar essa devastação e desenvolver um processo de conscientização profunda”, pontuou.

Em seguida, Yuma Inzolia se aprofundou na questão de como as mudanças climáticas podem impactar diretamente no direito à educação. Segundo ela, as universidades são uma força motriz para que possamos cumprir as metas da agenda 2030 da Unesco. “Desenvolvemos quatro pilares de aliança para uma educação ecológica: a criação de universidade verdes, onde todos os países terão adotado um sistema de acreditação verde com pelo menos 50% das escolas, faculdades e universidades credenciadas como verdes e operando de forma sustentável”, destacou. “O desenvolvimento de currículos verdes. O número de países que incluem a educação climática nos currículos acadêmicos deve dobrar ou pelo menos chegar a 45% da sua situação atual”, prosseguiu.

Yuma Inzolia, chefe de Formação e Desenvolvimento de Capacidades na UNESCO IESALC (Foto: Semesp/Juliana Freitas e Luiz Kagiyama)

Ela destacou também a formação verde de professores e do sistema educativo, com todos os diretores de escolas e pelo menos um professor por instituição treinados sobre como integrar a educação climática ao ensino e à aprendizagem. As comunidades verdes são o último pilar.  “Todos os países precisarão relatar pelo menos três maneiras diferentes de desenvolver oportunidades de aprendizagem para que desenvolvam suas capacidades, atitudes e ações, fora do sistema de educação formal, fortalecendo a resiliência das comunidades para lidar com as mudanças climáticas”, acrescentou.

“Até 2030, precisamos garantir que as pessoas em todo o mundo tenham a informação e a conscientização de que precisam para o desenvolvimento sustentável e estilos de vida em harmonia com a natureza”, defendeu Yuma Inzolia. “A capacitação não é um acessório na transição para universidades sustentáveis, é o fator fundamental que impulsiona uma mudança de mentalidade essencial”, complementou reforçando que as universidades são peças estratégicas para o desenvolvimento sustentável. “Mas elas não podem agir de maneira isolada. É preciso a construção de redes que irão multiplicar esforços e gerar impactos coletivos”, finalizou.

Deborah Nusche, representante da OCDE (Foto: Semesp/Juliana Freitas e Luiz Kagiyama)

Para a representante da OCDE, as políticas e as competências para um futuro sustentável precisam ser definidas dentro de um contexto mais amplo das políticas educacionais. “As mudanças climáticas não são problemas isolados: elas impactam a economia, a sociedade e setores inteiros como energia, agricultura, indústria e edificações. Práticas não sustentáveis nesses campos exigem transformações profundas e, sobretudo, interconexões entre eles”, explicou Deborah Nusche.

“A educação desempenha um papel fundamental para pensar de forma sustentável esses processos de mudança. Ela contribui para fomentar inovação econômica, para compreender a complexidade dos desafios e para destacar o que realmente importa. Nesse caminho, adaptação, resiliência e pensamento estratégico são peças-chave para enfrentarmos os impactos atuais e futuros”, prosseguiu Nusche. “Mas o cenário é complexo. Precisamos refletir sobre como as políticas podem ser implementadas: isso exige agência, disponibilidade, desenvolvimento de competências e capacidade de mudança sociocomportamental. É fundamental alinhar comportamentos individuais a objetivos e valores coletivos, estimulando participação cidadã, escolhas de carreira coerentes com esses valores e, sobretudo, o pensamento crítico capaz de identificar desinformação e greenwashing”.

Para Deborah Nusche, a mudança comportamental individual tem limites quando barreiras estruturais permanecem. Por isso, são necessárias mudanças sistêmicas, apoiadas no trabalho coletivo e na participação cidadã, seja por meio das eleições, dos protestos ou da construção de confiança nos processos decisórios, rumo a um sistema político mais inclusivo. “No âmbito da OCDE, buscamos integrar essa visão a sistemas de avaliação que incentivem os estudantes a exercer sua agência e a enfrentar desafios ambientais complexos. Para isso, precisamos de estratégias holísticas: reformas curriculares, capacitação docente, cooperação com parceiros externos e políticas regionais consistentes”.

Sobre o papel das instituições de ensino superior, Nusche defendeu que elas devem também liderar a formação e requalificação de adultos, preparando profissionais para as novas demandas da economia verde. “Isso exige não apenas competências técnicas específicas, mas também competências transversais, como pensamento crítico e alfabetização digital. O impacto dessas competências depende de onde e como são aplicadas, por isso, são igualmente essenciais para a transformação verde e para a economia do conhecimento”, finalizou.