O Instituto Semesp realizou duas pesquisas no mês de julho entre alunos e professores sobre a experiência com as aulas remotas. Foram entrevistados 2.588 estudantes de 459 instituições de ensino superior, sendo 343 privadas e 116 públicas, matriculados em 129 cursos de graduação. A pesquisa com docentes contou com a participação de 413 professores, de 130 IES, sendo 111 privadas e 19 públicas.

O ensino superior passou por um teste de capacidade de mudança e demonstrou que pode superar os desafios. Quase 100% das instituições privadas adotaram as aulas remotas rapidamente. Já nas públicas, conforme resposta dos alunos, apenas 41,8% adotou o modelo até o início de julho. Na opinião de 83,8% dos estudantes e de 93,5% dos docentes, as IES privadas acertaram na adoção do modelo de aulas remotas em virtude do momento de pandemia. Nas IES públicas, a opinião também foi positiva: 80,8% dos estudantes e 89,6% dos professores.

Passada a fase inicial de implantação emergencial do novo modelo de aulas, é possível verificar que várias IES estão monitorando a satisfação de seus estudantes e professores, o que é o correto; mas, por outro lado, muitas ainda desconhecem a opinião dos estudantes e professores sobre as aulas remotas. Conforme essas pesquisas revelaram, acompanhar a experiência dos envolvidos é fundamental para identificar, avaliar e realizar correções na organização das IES e na dinâmica das aulas remotas.

Confira Pesquisa Adoção de Aulas Remotas| Visão do Aluno 

Apesar da grande maioria dos alunos concordar que foi acertada a adoção das aulas remotas, apenas 46% avaliou a experiência como ótima ou boa. Entre os docentes, a avaliação foi melhor (71,2%).

84,2% dos professores da rede privada e 79,3% da rede pública afirmaram que estão preparados para lecionar de forma remota; no entanto, 37,9% dos alunos das IES privadas e 46,6% das IES públicas afirmaram que os professores não estão conseguindo apresentar aulas atrativas nesse formato. E menos da metade dos alunos (46% das privadas e 43,5% das públicas) avaliou como ótima ou boa a experiência com as aulas remotas no período de pandemia.

O percentual de alunos que qualificaram como ruim ou péssima a habilidade dos professores para trabalhar com os equipamentos ou softwares durante as aulas foi abaixo de 15%. Isso pode indicar que o foco do problema está na metodologia de aula, na didática dos professores e porque muitas instituições simplesmente fizeram a transposição no formato presencial para o remoto.

Confira Pesquisa Adoção de Aulas Remotas| Visão dos Docentes

Para o sucesso das aulas remotas, é preciso ter um professor preparado para utilizar de forma adequada a tecnologia disponível, capaz de proporcionar aprendizado e engajar os estudantes. 70,1% dos professores responderam que o apoio da IES foi ótimo ou bom na rede privada. Da mesma forma, 71,3% responderam que a experiência no ensino remoto foi positiva.

Não há dúvida, as IES conseguiram transpor a tormenta e fizeram a mudança do ensino presencial para o remoto muito em função da dedicação dos professores e da colaboração entre eles. Um dos pontos positivos mais comentados pelos docentes foi apoio dos colegas de profissão, a troca de experiências entre eles, a ajuda mútua e o compartilhamento do conhecimento durante o período de adaptação. As instituições que querem ter sucesso com as aulas remotas, flexíveis e mediadas por tecnologias, precisam agora investir no professor, incentivando-o a ter competências digitais, para que ele engaje os estudantes no aprendizado.

Os professores pesquisados relatam a dificuldade de engajar os estudantes nas aulas. Sobre a participação dos alunos, cerca de 70%, das redes pública e privada, entendem que os alunos estão menos atentos e participativos nas aulas remotas.

Um ponto frágil detectado pela pesquisa foi o fato dos alunos não se sentirem motivados a participar das aulas. Na perspectiva deles, as aulas são cansativas e sem interação. De modo geral, a metodologia da aula utilizada pelo professor não foi suficiente para engajar os estudantes.

Nas aulas remotas, muitos professores se deparam com alunos que não abrem a câmera e não habilitam o microfone. Aliás, os professores afirmam que é uma experiência negativa dar aula para estudantes que ficam calados, com câmera e microfone desligados. Alguns relatam ansiedade e depressão.

Vejam os pontos positivos e negativos para professores no que se refere à experiência das aulas remotas no período da pandemia.

Aspectos positivos                              Aspectos Negativos

Apoio dos colegas, com troca de experiências entre os docentes.Pouca participação e interação dos estudantes.
Aprendizado no uso de ferramentas tecnológicas.Falta de equipamentos, softwares e internet de boa qualidade.
Uso de novas metodologias de ensino.Adaptação em um curto espaço de tempo ao ensino remoto, sem possibilidade de planejamento.
Qualidade de vida com redução de deslocamentos.Ter que mudar em pouco tempo as metodologias e didática das aulas.
Novos desafios e novas experiências.Formas de avaliação com pouca eficácia e capacidade de diagnóstico.

 

Para os professores, há fatores que podem ser encarados como positivos e negativos, ao mesmo tempo, o que demonstra os diferentes níveis de preparo do docente para atuar com o ensino remoto e usar as tecnologias digitais. De um lado, o docente está satisfeito com o aprendizado, do outro, preocupado em utilizar metodologias e tecnologias que desconhece.

Há afirmações interessantes de professores, por exemplo: “aprender rapidamente foi um desafio. Porém achei uma alternativa fantástica para o momento”. Temos uma hipótese: muito do aprendizado do docente aconteceu de forma espontânea e proativa, ele próprio se dispondo a buscar soluções para melhorar o ensino remoto.

Na opinião dos alunos, vejam os aspectos negativos e positivos:

Pontos Positivos                                                 Pontos negativos

Facilidade de adaptação com as aulas remotas.Metodologias que não motivam, são pouco atrativas e cansativas
A dedicação dos docentes.Dificuldade de concentração e adaptação com as aulas remotas.
Qualidade de vida com economia de tempo e dinheiro.Falta de equipamentos, softwares e internet de boa qualidade.
Novas metodologias aplicadas para as aulas.Valor das mensalidades permaneceu o mesmo e os descontos foram mínimos.
Suporte e comunicação das IES.Suporte e comunicação das IES.

 

Na mesma perspectiva dos docentes, a pesquisa com os alunos demonstra que as opiniões são divergentes, porém, traz uma série de indicações para melhoria das aulas remotas. Não temos dúvida, a aula remota ou online precisa engajar o estudante e ser melhor preparada e estruturada.

Os estudantes reconhecem o esforço dos professores, mas há limites quando os próprios professores não estão preparados para atuar no ambiente digital. Outro aspecto importante é o acesso. Se o aluno não tem internet e equipamento para acessar a aula, todo o esforço dos gestores e dos professores será invalidado. Talvez, uma alternativa para os gestores é a busca de parcerias com as empresas de internet, computadores e telefonia, para oferecer ao aluno condições de acesso às aulas. O governo federal também precisa criar incentivos fiscais ou proporcionar linhas de investimento para que os estudantes possam ter acesso às aulas.

Uma alternativa interessante para os alunos que não têm bons equipamentos, internet e, sobretudo, ambiente para estudar é a instituição reabrir não para aulas expositivas, mas como espaço de aprendizagem. Os alunos poderiam utilizar o campus para estudar, assistir a aulas remotas e receber suporte, respeitando, claro, todos os protocolos de segurança, sem a necessidade de colocá-los em sala de aula.

Outra questão importante levantada pela pesquisa é a eficiência da comunicação. Para os estudantes dos cursos presenciais, apenas 43,1% das instituições privadas e 48,7% das públicas classificaram como ótimo ou bom o processo de comunicação. Nos cursos em EAD, o índice aumenta para 73,7%. Provavelmente, na área do EAD, as IES estão preparadas para a comunicação remota. De toda forma, esse é um problema real que gera muita insatisfação.

A despeito das dificuldades enfrentadas com a suspensão das aulas presenciais e a migração para as aulas remotas, quase metade dos alunos das instituições públicas (48,7%) e privadas (47,7%) declarou interesse em continuar com as aulas remotas, porém, a maioria gostaria que as aulas fossem um mix do presencial com o remoto.

Fonte: Pesquisa Adoção das Aulas Remotas – Visão dos Alunos. Instituto Semesp

Dentre os alunos que afirmaram preferir continuar com as aulas totalmente presenciais, a maioria é de cursos cuja carga horária de aulas práticas é preponderante, principalmente da área da saúde.

Entre os professores, mais da metade declarou que gostaria de permanecer com aulas remotas síncronas: 54,4% nas IES privadas e 55,2% nas públicas; no entanto, assim como no caso dos alunos, a grande maioria desses prefere o mix entre ambas.

Fonte: Pesquisa Adoção das Aulas Remotas – Visão dos Docentes. Instituto Semesp

Os dados representam um desafio para o gestor. Quando tivermos uma vacina contra a Covid-19, o que faremos? Retornaremos com as aulas presenciais ou vamos oferecer definitivamente os 40% que a legislação permite, com aulas remotas e/ou híbridas? Vamos oferecer o EAD assíncrono ou síncrono? Muitos gestores devem estar se perguntando no que investir ou priorizar em tempos de pandemia. Há muitas incertezas e poucas certezas no setor educacional.

Com base na pesquisa do Instituto Semesp sobre aulas remotas, apontamos cinco ações de boas práticas para os gestores de IES:

  • Tenha uma proposta de mudança bem definida: elabore um projeto com a participação de diferentes setores, demonstre que a IES tem um plano plausível e alinhado com a capacidade de investimento da instituição para enfrentar o momento de turbulência.
  • Qualifique a comunicação com estudantes, professores, técnicos-administrativos e sociedade: a comunicação é um fator crítico de sucesso porque a IES precisa sinalizar o caminho que irá seguir para enfrentar a pandemia e outras dificuldades. O diálogo contínuo gera confiança e diminui desconfianças. O website da IES precisa ir além da campanha de captação.
  • Proponha um modelo de aula remota: os estudantes e professores precisam conhecer o modelo acadêmico da IES, por isso, uma diretriz sobre como funciona e quais são as metodologias, as tecnologias e a plataforma é necessária para evitar fragmentação das energias e diferentes abordagens.
  • Capacite seus professores: o investimento prioritário da IES em tempos de incertezas, mudanças e pandemia é o professor, responsável pelo aprendizado dos estudantes. É o docente que irá utilizar estratégias para engajar os alunos e será o elo de comunicação em tempos de distanciamento social. O docente precisa de competência digital, de suporte e de incentivo para fazer experiências acadêmicas.
  • Faça mudanças que remetam a transformação digital da IES: A transformação digital requer mudança da cultura institucional e recursos financeiros. Para evitar altos gastos, a IES pode planejar as etapas dos investimentos em internet das coisas, AI, big data, análise preditiva, entre outras tecnologias digitais. Todavia, a IES não pode se furtar de ter uma boa plataforma, design institucionais de apoio, tecnologias educativas e ações para facilitar o acesso do estudante às aulas remotas.

Alunos, professores e instituições de ensino tiveram que enfrentar muitas dificuldades de adaptação ao modelo remoto, como problemas de acesso à tecnologia, plataformas pouco preparadas para o estudo online, desconhecimento de novas metodologias de ensino, impossibilidade de realização de aulas práticas ou estágios obrigatórios, entre outras. Em contrapartida, o ganho de qualidade de vida e o potencial de enriquecimento dos cursos pela transposição da barreira do presencial também são inquestionáveis.

Mas muito cuidado! Quem vê o modelo de aulas remotas como uma oportunidade para reduzir custos por meio do ensalamento de turmas pode estar incorrendo em um equívoco que vai trazer muitos prejuízos no futuro. A formação de turmas grandes em plataformas de aulas remotas vai na contramão de tudo que foi levantado pelos alunos e docentes. Não há como fazer aulas que não sejam cansativas, pouco interativas e com baixa participação dos alunos com turmas grandes no modelo online. A insatisfação vai aumentar muito, a pressão por redução de mensalidades irá crescer e a evasão pode ser desastrosa. O aluno que escolhe um curso presencial, além da vivência no campus, quer contato com professores e colegas, quer ser protagonista, o que não vai acontecer se estiver dentro de uma plataforma online com muitos outros estudantes ao mesmo tempo.

Está claro que o modelo adotado de aulas remotas é emergencial e que haverá o retorno da presencialidade no período pós-pandemia. No entanto, é preciso entender que, a partir do emergencial, muita coisa pode ser aproveitada na criação de um novo modelo que combine aulas remotas com atividades presenciais.

A vivência dos alunos, familiares, professores e gestores de instituições com a educação remota deverá provocar, no mínimo, uma discussão construtiva e instigante sobre esse tema. O que realmente irá ter valor para todos é o sucesso do modelo de ensino.

*Fábio Reis, diretor de Inovação e Redes do Semesp

* Rodrigo Capelato, diretor-executivo do Semesp