Novos instrumentos de avaliação simplificam o processo e facilitam adaptações futuras, mas ainda pecam na observação da diversidade de instituições

Amanda Cieglinski

A partir do segundo semestre de 2011, os cursos superiores terão novos instrumentos de avaliação. A Comissão Nacional de Avaliação da Educação Superior (Conaes) está em fase final do trabalho de revisão desses instrumentos após estudos e audiências públicas para discutir o tema. O objetivo é tornar mais simples esses documentos que são o guia do avaliador do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) na hora de analisar a qualidade dos cursos.

O resultado foi um “enxugamento” do material, como define o próprio presidente da Conaes, Sérgio Franco. Até então existiam 12 instrumentos avaliativos para áreas específicas e para os diferentes atos autorizativos – autorização, reconhecimento e renovação. Agora serão apenas três para qualquer etapa: um único para os bacharelados, licenciaturas e tecnológicos (presenciais e EAD), outro para as graduações em medicina e um exclusivo para o direito.

Esse enxugamento já estava nos planos da Conaes há algum tempo. “No decorrer das avaliações a gente percebeu que havia problemas até de coerência, certos instrumentos tinham escalas diferentes entre si e alguns indicadores não traziam a informação esperada”, aponta Franco.

Cada instrumento tem de 33 a 47 indicadores aos quais os avaliadores deverão atribuir um conceito de 1 a 5. A avaliação permanece dividida em três dimensões: projeto político-pedagógico, corpo docente e infraestrutura. O peso de cada dimensão na nota final irá variar de acordo com o “momento” do curso. Na autorização, por exemplo, a infraestrutura terá peso maior do que o quadro de professores. “No caso dos indicadores que são específicos do ato, o avaliador vai julgar se avalia ou não, porque não se aplica àquele curso naquele momento”, explica a diretora de Avaliação da Educação Superior do Inep, Cláudia Griboski.

Mesma medida
Durante os meses de junho e julho a Conaes promoveu três audiências públicas para apresentar os novos instrumentos às instituições de ensino e colher sugestões de mudança. Por um lado, a redução do número de instrumentos foi considerada positiva pelos gestores educacionais. “Isso é muito interessante e possibilita haver uma coerência na vida do curso todo para uma sequência de crescimento”, acredita Gustavo Monteiro Fagundes, consultor jurídico do Instituto Latinoamericano de Planejamento Educacional (Ilape).

Por outro lado, representantes do setor privado consideram que os novos manuais ainda pecam justamente por utilizar os mesmos indicadores de qualidade para os diferentes modelos de instituições – faculdades, centros universitários e universidades. “O ponto positivo é que os instrumentos estão mais organizados e mais estruturados. Mas, enquanto o manual facilita, também padroniza. Se existe um determinado indicador que é o mesmo para todas as instituições, quanto mais perto você estiver de uma universidade melhor será a sua nota. Os mais prejudicados serão as faculdades”, acredita Maurício Garcia, vice-presidente de planejamento e ensino do grupo DeVry Brasil.

Inep e Conaes defendem que apesar de o instrumento ser único, ele contempla os diferentes modelos de instituição e a heterogeneidade de propostas pedagógicas existentes no país. A diretora do Inep ressalta que com o novo modelo não será necessário trabalhar com a aprovação de instrumentos, mas com a construção de indicadores. “Mudanças ocorrem sempre e caso seja preciso substituir um indicador por outro não será necessário criar um novo instrumento”, aponta Cláudia.

Para o presidente da Conaes, o objetivo da avaliação é constatar as fraquezas, e não compensar as falhas. Franco admite que em alguns casos os dois processos – avaliação e regulação – ainda se misturam. Mas não acredita que por causa dos diferentes modelos de instituição e propostas pedagógicas os indicadores de qualidade devam ser nivelados “por baixo”. Ele defende que o papel dos instrumentos é justamente induzir à melhoria da oferta de ensino.

O Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular encaminhou um documento à Conaes com sugestões de mudanças aos novos instrumentos. A principal crítica é que houve um aumento da exigência de titulação do corpo docente em alguns casos específicos. Para os tecnológicos, por exemplo, para obter conceito 3 nesse indicador o percentual mínimo de doutores deverá ser de 9% – antes a exigência era apenas de pós-graduação stricto sensu, sem especificação do título. “A quantidade de docentes com titulação ainda é incompatível com a nossa realidade. Principalmente para as faculdades menores ou localizadas no interior, onde não há oferta de pós-graduação para atender aos critérios”, pondera Fagundes.

Os instrumentos ainda não estão finalizados: em agosto a Conaes se reúne para discutir as contribuições que foram apresentadas durante as audiências públicas. Segundo Franco, todas as sugestões apresentadas pelas instituições serão consideradas.

Proposta polêmica
Um projeto de lei que tramita no Senado, já aprovado pela Comissão de Educação, poderá alterar a exigência de titulação do corpo docente de cursos superiores. Pela proposta, profissionais apenas com graduação, sem qualquer tipo de especialização, poderiam ser admitidos temporariamente. O MEC e entidades de pesquisa como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) se posicionaram radicalmente contra a mudança que alteraria a Lei de Diretrizes e Bases (LDB). No setor privado também não há consenso de que a medida poderia trazer algum tipo de benefício para o ensino. O Fórum das Entidades Representativas do Ensino Superior Particular se posicionou oficialmente contra o projeto. “O Fórum defende e defenderá sempre a qualidade do ensino e considera que a qualificação dos professores é de extrema importância no processo de ensino e aprendizagem”, diz nota oficial.

Para o presidente da Conaes, Sérgio Franco, o Brasil se tornará “motivo de chacota” caso o projeto de lei seja aprovado. “Isso seria um grande retrocesso. Um país que quer ser potência aceitar professor com graduação quando no resto do mundo se trabalha pela pós-graduação”, lamenta.

Gustavo Fagundes, consultor jurídico do Instituto Latinoamericano de Planejamento Educacional (Ilape), também acredita que a mudança poderá ser prejudicial para as próprias instituições de ensino. Ele pondera que apesar de ser necessária uma flexibilização da exigência de mestres e doutores no corpo docente, especialmente em regiões do país onde não há profissionais com essa titulação, acabar com a obrigatoriedade da especialização é uma medida temerária.

A matéria está pronta para ser votada no plenário e se aprovada seguirá para apreciação na Câmara.