Fábio Garcia Reis 

Uma das características do século 21 é a construção de redes. No livro “A Sociedade em Redes“, Manuel Castells define redes como conjuntos de “nós interconectados”, com uma estrutura dinâmica, flexível e aberta, que representam uma alternativa para que as organizações possam estabelecer processos de compartilhamento, com benefícios mútuos.

No segmento do ensino superior, as experiências internacionais com redes de cooperação têm demonstrado serem extremamente eficazes para garantir que as instituições educacionais participantes desses sistemas de compartilhamento obtenham sucesso em seus empreendimentos. Há inúmeras experiências globais bem-sucedidas em matéria de redes de cooperação regionais no ensino superior, que começaram com ações de compartilhamento no transporte dos alunos, ou com iniciativas que visavam atrair estudantes para uma determinada cidade e região. A desconfiança e a perspectiva de que instituições concorrentes não conseguissem dialogar foi superada pela clareza de que as IES participantes poderiam cooperar e m atividades administrativas que proporcionariam redução de custos.

Nos EUA, por exemplo, o consórcio Five Colleges, da região de Amherh, em Massachusetts, fez 50 anos em 2014. Nos últimos 20 anos essa rede de cooperação, que começou com compartilhamento de ônibus, depois das bibliotecas, e com compras conjuntas de computadores, chegando até à formação de professores, conseguiu uma economia de US$ 20 milhões.

O Colleges of the Fenway, um consórcio da cidade de Boston, criado para que um grupo de instituições de ensino superior conseguisse sobreviver em meio às grandes universidades da região (MIT, Harvard, Boston College), passou a compartilhar informações sobre experiências e dificuldades e sobre novas ideias e formas de cooperação. Não disputando alunos (cada IES tem a sua forma de captação), o consórcio obteve, em 2014 e 2015, uma economia de US$ 2,5 milhões.

Os relatórios de prestação de contas destes consórcios evidenciam que trabalhar em redes de cooperação regionais significa para as IES participantes economia de escala e estabelecimento de sinergias que melhoram a qualidade dos serviços educacionais.

No Brasil não é comum as instituições de ensino superior construírem redes, pois não está na cultura dos dirigentes das IES compartilhar ideias, projetos e ações efetivas que permitam sinergias e economia em escala na área acadêmica e administrativa. De modo geral, os acordos de cooperação interinstitucional são evitados no país porque prevalece o princípio do “segredo estratégico” e a visão de que a concorrência por alunos, recursos financeiros e prestígio requer distanciamento do concorrente. Cada IES deve utilizar seus próprios meios para obter sucesso em suas estratégias. Desse modo, o diálogo deve ser restrito, pois a perspectiva é de que a outra instituição é um ”inimigo” a ser vencido.

Esse é o motivo pelo qual prevalecem poucos exemplos dessas iniciativas no Brasil, como o Consórcio das Universidades Comunitárias Gaúchas (Comung), que reúne 15 IES, e o Consórcio STHEM Brasil, que reúne 45 IES de 11 diferentes estados do país. Há ainda grupos de interesse que integram diversas IES, como a Associação Brasileira de Educação internacional (FAUBAI), que reúne aproximadamente 180 gestores e responsáveis por assuntos internacionais em suas IES.

A criação de redes de cooperação de caráter regional, no entanto, é uma crescente necessidade em nosso país. Em um ambiente de avanço da internacionalização e da competitividade, assim como de incertezas políticas e de crise econômica como vivemos no Brasil, as redes de compartilhamento no setor do ensino superior, com foco nas áreas acadêmicas e administrativas, poderiam representar teias de aprendizagem institucional sólidas e eficazes, capazes de favorecer sinergias e diminuir os custos operacionais das instituições participantes. Essas redes podem ser constituídas a partir da definição de dois ou três projetos que sejam de interesse das IES, como, por exemplo, na área de com pras e licenciamento de software, com as ações de cooperação sendo acompanhadas por planejamento e avaliação dos resultados.

Para isso, os dirigentes das IES brasileiras precisam superar posturas reticentes e deixar de lado o preconceito em relação à formação desses consórcios. Os “nós” que interconectam as instituições de ensino superior precisam gerar relações de confiança, para que a criação das redes possa representar uma mudança cultural e a superação do isolamento institucional, permitindo às IES encontrarem mecanismos sustentáveis para capacitar as pessoas, compartilhando ações administrativas com o objetivo de gerar economia em diversas áreas.

Mais do que isso, no entanto, é preciso considerar que as redes de cooperação regionais vão além de favorecer apenas a redução de custos. O que está em jogo são projetos comuns que permitem melhorar a qualidade do ensino superior dessas instituições, uma condição que o Brasil necessita com enorme urgência.

 

(*) Diretor de Inovação e Redes do Semesp e professor da Unisal. Doutor em História Social pela USP. Autor do livro“Perspectivas da Gestão Universitária”. Especialista em Gestão Universitária com estágios nas Universidades de Salamanca e Valência e cursos de extensão nas Universidades de Montreal, Harvard, Pequim e Londres.