Após a crise econômica, o governo dos Estados Unidos aposta na educação a distância e no uso da tecnologia para recuperar a qualidade do ensino superior no país e reerguer o sistema educacional

por Ana Bernstein, de Nova York

 

 

O déficit na economia americana não se restringiu aos setores produtivos de mercado, respingando também na área educacional. Os Estados Unidos, que já lideraram o mundo no número de pessoas entre 25 e 34 anos com diploma de nível superior, caíram para 120 lugar no ranking de países com maior proporção de universitários formados nessa faixa etária. À frente do país estão Canadá, Coreia do Sul, Rússia, Japão, Nova Zelândia, Irlanda, Noruega, Israel, França, Bélgica e Austrália.

O abalo levou o governo dos Estados Unidos a pôr em prática um ambicioso plano para reerguer o sistema de educação do país. Além da completa reestruturação do financiamento estudantil, que entrou em vigor em 2010, o Departamento de Educação dos EUA busca recuperar a reputação do país entre os líderes no âmbito educacional por meio do Plano Nacional de Tecnologia Educacional 2010 intitulado Transformando a Educação na América: Aprendizado Movido a Tecnologia.
O documento propõe alterações profundas no sistema de educação americano, a fim de criar um modelo de ensino próprio ao século 21 e aumentar para 60% da população a proporção de universitários formados até 2020. Isso significa formar oito milhões a mais de universitários até 2020.

Motor tecnológico
O Plano Nacional de Tecnologia Educacional enfatiza a integração de tecnologias e a conectividade como meios de tornar o aprendizado mais engajado e interessante; proporcionar maior riqueza de conteúdo; produzir melhores avaliações de ensino e, ao mesmo tempo, reduzir custos. O modelo educacional do século 21 proposto pelo plano pressupõe uma infraestrutura de aprendizado flexível, permanentemente disponível e ao alcance de professores, alunos e administradores, independentemente do dia, hora ou local. A ideia é possibilitar o acesso à informação e a participação efetiva em comunidades virtuais globais de aprendizado.

Além da expansão nacional da banda larga, que estenderá o acesso à internet a 100 milhões de habitantes em áreas rurais dos Estados Unidos, e da criação de um Registro Nacional de Aprendizado que facilitará o acesso e a pesquisa junto a órgãos federais e instituições culturais, o governo prevê investir US$ 500 milhões em dez anos para o desenvolvimento do laboratório on-line de conhecimentos profissionais com o objetivo de auxiliar na produção de uma nova geração de cursos de educação a distância, de alta qualidade, em faculdades comunitárias.

O modelo para a distribuição dos cursos entre as instituições segue a plataforma de recursos educacionais abertos (conhecida por OpenCourseWare), criada pelo Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) em meados dos anos 1990. Os cursos ainda podem ser adaptados por professores a fim de atender às suas necessidades de ensino e por empresas interessadas em desenvolver produtos educacionais derivados desses materiais.

Aposta na EAD
O ensino a distância nos Estados Unidos vem crescendo consideravelmente nos últimos anos. Segundo um relatório do Sloan Consortium, organização dedicada ao desenvolvimento e integração do ensino on-line, mais de 4,6 milhões de estudantes universitários fizeram pelo menos um curso a distância no outono de 2008. De acordo com Jeff Seaman, um dos autores da pesquisa, a taxa de crescimento no número de estudantes on-line nos últimos anos nos EUA tem sido constante. “Em apenas sete anos, vimos o número de estudantes fazendo cursos on-line aumentar além do dobro. Se você examinar o gráfico atual, uma quantidade considerável de toda a comunidade educacional está fazendo pelo menos um curso a distância”, conta.

De fato, o número de alunos inscritos em cursos on-line cresce em proporção bem maior do que o da própria população estudantil universitária. Em apenas um ano, o número de estudantes matriculados em cursos on-line cresceu 17%, enquanto a população estudantil como um todo cresceu apenas 1,2%. A pesquisa ainda indica que o ensino on-line continuará a se expandir nos próximos anos. A demanda por cursos virtuais exacerbou-se ainda mais com a recessão econômica, já que muitos trabalhadores desempregados estão buscando novas qualificações profissionais em áreas com melhores promessas de emprego.

Embora diversas instituições privadas de ensino ofereçam cursos de educação a distância, são as universidades públicas e as faculdades comunitárias que se destacam na área. “As universidades públicas, sustentadas por governos locais e estaduais, representam a maioria dos estudantes on-line. Elas foram as primeiras a entrar no mercado e vêm demonstrando um crescimento constante durante todo o tempo”, diz Seaman.

O perfil dos estudantes que buscam por cursos a distância, porém, vem se alterando. Os cursos on-line, geralmente “frequentados” por um público específico de adultos para o qual o ensino presencial é uma impossibilidade por razões diversas – família, trabalho, localização geográfica etc. – vem atraindo cada vez mais jovens. “Há um número crescente de estudantes decidindo-se por criar seus próprios programas híbridos”, comenta Seaman.

Além da flexibilidade e conveniência, outras vantagens do ensino a distância foram contabilizadas pelo Departamento de Educação americano para investir no modelo. Para os idealizadores do plano educacional americano, os cursos on-line possibilitam oferecer ensino de alta qualidade em locais que normalmente têm dificuldades em recrutar e manter bons professores, como as áreas rurais e regiões mais pobres do país, o que torna o ensino de qualidade mais barato.

A asserção de que o ensino on-line reduz custos é baseada em parte em experiências realizadas pelo projeto Open Learning Initiative (OLI) da Universidade Carnegie Mellon. O programa desenvolve cursos on-line de alta qualidade abertos e gratuitos, também usados pela universidade em modalidade híbrida e que são distribuídos para outras instituições de ensino superior.

O custo menor da EAD em relação ao ensino presencial, entretanto, não é referendado pelo pesquisador Jeff Seaman. De acordo com ele, as pesquisas realizadas nos últimos sete anos pelo Sloan Consortium indicam que os custos do ensino on-line são iguais ou até maiores do que o ensino tradicional. “Num certo momento as pessoas pensaram que seria menos caro, porque não precisariam de prédios ou outras coisas, mas isso não se concretiza de fato”, diz.

Para Janet Moore, diretora Executiva de Conhecimento do Sloan Consortium, mesmo com custos equiparados ao do ensino tradicional a transformação das universidades pelo ensino on-line é inevitável. “O que está mudando na educação é o potencial para uma colaboração massiva e global”, reflete Janet. Ela diz que o conhecimento está mudando tão rapidamente que o aprendizado presencial corre o risco de se tornar obsoleto. “Haverá também maior colaboração entre as universidades porque a manutenção dos repositórios é extremamente cara, então faz sentido o compartilhamento de conteúdos, inclusive internacionalmente”, acrescenta.