MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO

CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

INTERESSADO: Organização Guará de Ensino

UF: SP

ASSUNTO: Consulta sobre o curso de Pedagogia – Complementação pedagógica, tendo em vista o Parecer CES/CNE 337/2001 e a Resolução CP/CNE nº 2/97.

RELATOR(A): Carlos Alberto Serpa de Oliveira

PROCESSO Nº: 23001.00061/2003-13

PARECER Nº: 015/2003

COLEGIADO: CP

APROVADO EM: 30/9/2003

I – RELATÓRIO

§ Histórico

A Faculdade de Educação de Guaratinguetá, por intermédio da Profªº Maria Lúcia B.Z.M. Jacupino, encaminha consulta sobre a possibilidade de oferecimento de Curso de Complementação Pedagógica – habilitação em Administração Escolar (Gestão Escolar), como parte de programa, ipsis litteris, “Curso `Programas especiais de formação pedagógica` haveria a formação de `docentes no nível superior sendo que estes programas destinam-se a suprir a falta nas escolas de professores habilitados, em determinadas disciplinas e localidades, em caráter especial` Resolução nº 2/97” (sic).

A missivista declara a intenção da Instituição em oferecer “este programa para formar docentes conforme esta Resolução nº 2/97; mas a preocupação atual é (…) oferecer a diplomação de ‘Licenciados’ em Gestão Escolar” (sic). A consulta termina indagando se o Parecer CES/CNE 337/200l poderia servir como fundamento legal para oferecer uma complementação de 1.100 horas com aproveitamento de experiência anterior e indaga a duração da carga horária do estágio supervisionado.

§ Mérito

A Resolução CP/CNE 02/97 tem por lastro o Parecer CP/CNE 04/97, que diz:

“Há grande necessidade de formação de professores para atender à falta deles nas quatro últimas séries do primeiro grau e no segundo grau. Entretanto há diferenças dentro desse quadro geral que requerem atenção especifica quanto às medidas a serem tomadas.”

Note-se, preliminarmente, que o motivo que presidiu a instalação de legislação específica para permitir que profissionais não-licenciados obtivessem uma licença para a docência não se localiza nas séries iniciais do ensino fundamental, tampouco na educação infantil, mas sim nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio. Portanto, a resolução que decorreu deste Parecer não poderia ser utilizada para evidenciar preocupação com a formação de profissionais que atendessem as faixas etárias próprias daqueles níveis. Havia, isso sim, incontestável preocupação com a diversidade regional brasileira e carências específicas, regionais e temporárias. Diz ainda o Parecer:

“a) As diferentes regiões, estados e municípios apresentam necessidades diversas. É preciso considerá-las, a fim de não disseminar problemas em lugar de soluções.

b) As disciplinas, ou áreas de conhecimento, também apresentam diferenças, cujo atendimento tem que ser feito com cuidado. Sabe-se que a falta de professores se dá especialmente nas disciplinas de matemática, física, química, geografia, mas sabe-se também que essa falta não se apresenta de maneira idêntica por todo o país, por isso, sendo muito importante a consideração da situação especifica de cada local.

Há uma história já longa em torno da formação de professores em nosso país, que não pode ser ignorada, ao nos voltarmos para a busca de soluções dos problemas atuais, sob pena de repetirmos erros já cometidos e não aproveitarmos lições já aprendidas. Sob este aspecto é bom lembrar os problemas desencadeados com a instalação da licenciatura curta nos anos 70, que procurava também atender à falta de professores, mas produziu, e produz ainda, efeitos negativos sobre sua formação, tanto no que se refere à preparação nos domínios específicos das disciplinas cientificas, quanto no pedagógico. ”

É manifesta a intenção inicial de não re-editar soluções antigas, mormente esquecendo-lhes os defeitos e as lições aprendidas.

O Parecer prosseguia enfatizando o caráter emergencial da iniciativa, frisando a determinação de fazê-la limitada temporalmente, evitando o risco de eternizar soluções cuja caducidade poderia ser facilmente antevista. Dizia:

“Para garantir o caráter emergencial é conveniente que a proposta se oriente para a proposição de programas, em lugar de cursos, como é facultado pela LDB, cuja duração ficará assim naturalmente limitada, evitando o risco de perenização de soluções que podem parecer apropriadas para um determinado tempo e lugar, mas podem se tornar obsoletas com a evolução da situação local. Neste sentido é muito importante que os sistemas de ensino assegurem o levantamento exato das condições locais, em termos de escolas e professores, em cada disciplina, com dados estatísticos confiáveis, para que se criem programas de qualidade indiscutível visando o atendimento das necessidades reais.”(grifo adicionado).

As expressões “qualidade indiscutível” e “atendimento das necessidades reais” ganharam ênfase nesse parágrafo, seguramente não por motivo fortuito. Presente o risco, ontem como hoje, de se oferecerem programas com vulto de cursos, de qualidade discutível, em atendimento a necessidades diversas das reais, que nada tenham a ver com o suprimento de professores em carência em determinadas regiões, por determinado tempo. Não por outro motivo, o aludido Parecer diz que tais programas só poderiam ser oferecidos diante de demandas efetivamente comprovadas pelos sistemas de ensino, diante de dados confiáveis, em cursos cuja qualidade fosse notória.

Essa preocupação com a qualidade dos cursos tinha razão de ser, de vez que era instituída via de acesso heterodoxa à profissão do magistério, em vista de situações transitórias. A falta de avaliação constante poderia comprometer a qualidade do professor que viesse a ser formado, o que traria, em curto prazo, prejuízo à formação dos alunos da educação básica, em frontal desacordo com o texto constitucional. De fato, é da dicção da Constituição Federal que a educação pública deve ser não apenas pública, mas perseguir padrão de qualidade. Isso implica necessariamente perseguir a qualidade nos cursos de qualificam profissionais para o magistério, tanto os ortodoxos como aqueles emergenciais.

Esse caráter deliberadamente provisório foi realçado no documento não apenas por intermédio de redação inequívoca no corpo do Parecer CP/CNE 04/97, mas também no próprio texto da Resolução que o acompanhava.

Assim, reza seu artigo 11:

“Art. 11 – As instituições de ensino superior deverão manter permanente acompanhamento e avaliação do programa especial por e/as oferecido, integrado ao seu projeto pedagógico.

Parágrafo único – No prazo de cinco anos o CNE procederá à avaliação do estabelecido na presente resolução.”

As universidades e também IES sem hierarquia universitária, contanto que estas últimas já estivessem oferecendo cursos de licenciatura plena reconhecidos correspondentes às disciplinas nas quais a oferta seria feita, poderiam desenvolver o programa especial independentemente de autorização prévia. As instituições sem hierarquia universitária que não se enquadrassem no caso descrito acima deveriam requerer autorização específica, na qual deveriam comprovar disponibilidade de professores e de outros aspectos de infra-estrutura institucional. Contudo, todas as instituições que passassem a oferecer o novo programa deveriam contar com acompanhamento cuidadoso e avaliação detalhada e documentada, de modo a permitir sua verificação pelo órgão encarregado de sua supervisão sempre que necessário. Após três anos de experiência cada programa deveria ser avaliado, através de documentação pertinente, enviada ao Conselho de Educação competente, que daria seu parecer sobre a continuidade ou não do referido programa. Diversos Pareceres desta casa já versaram sobre o assunto, cabendo destacar, entre eles, o Parecer CP/CNE 25/2002 da lavra do insigne conselheiro Carlos Roberto Jamil Cury.

A consulta em tela indaga a possibilidade de utilizar o mesmo recurso legal, a Resolução CP/CNE 02/97, para conferir certificado de conclusão equivalente ao diploma de licenciatura em pedagogia, com habilitação em administração escolar. De fato, diversas instituições universitárias têm oferecido este recurso, combinando o disposto na Resolução CP/CNE 02/97 e do Parecer CES/CNE 337/2001. Têm sido oferecidos programas de três semestres de duração, com aulas exclusivamente aos sábados, para portadores de diploma de licenciatura, o que lhes conferiria a possibilidade de se habilitar ao cargo de diretor, nos termos do art. 64 da Lei 9.394/96.

O disposto na Resolução CP/CNE 02/97 fala expressamente de uma situação transitória de falta de professores em disciplinas específicas. A preocupação com a qualidade dos programas eventualmente oferecidos é expressa e legítima, encontrando em nossa Carta Magna perfeita consonância. Por outro lado, o Parecer CES/CNE 337/2001 tem a extensão de uma única linha e se limita a afirmar que nada obsta uma proposta de aproveitamento de estudos. Jamais esse parecer, extremamente breve, diga-se de passagem, poderia ser esgrimido como fundamento legal para que uma nova possibilidade de formação de diretores escolares e gestores de processos educacionais pudesse ser instituída, muito menos para estabelecer uma via alternativa ao disposto na Lei 9.394196, tanto em seu Art. 47 quanto no Art. 64.

Ademais, a partir de 2002 temos um novo marco para a formação de professores, com as Resoluções CP/CNE 01/2001 e 2/2002, que dispõem não apenas sobre a formação de professores e as diretrizes gerais a serem observadas inclusive por instituições universitárias, mas, sobretudo com a duração mínima dos cursos, com limites rígidos para aproveitamento de estudos, assunto tratado no Parecer CES/CNE 337/2001.

A proposta de oferecer cursos para formação de gestores deve estar em sintonia com a legislação em vigor. Assim, o Art 64 da lei 9.394/96 tem clareza meridiana e diz claramente qual o perfil requerido do gestor. O aproveitamento de estudos, para esse fim, só pode ser feito em curso de graduação regular. Existe a alternativa de oferecer a formação de gestores em nível de pós-graduação, em vista do disposto na própria LDBEN e na normatização complementar realizada por este CNE.

Em síntese, os programas de complementação pedagógica amparados na Resolução CES/CNE 02/97 se destinam a profissionais com diploma de bacharelado ou denominação específica que tenham sólida formação teórica e podem ser oferecidos em regiões onde exista reconhecida carência de professores. Caso ocorram em situação diversa, tais programas não estão em acordo com a referência legal que lhes serve de base e, carecendo de legalidade, não configuram ato jurídico perfeito.

Os cursos de formação de professores que acolhem estudantes por transferência não podem ser confundidos com programas de complementação pedagógica. Devem ter obrigatoriamente 200 dias letivos de efetivo trabalho acadêmico, além de estarem, a partir de fevereiro de 2004, de acordo com o disposto nas Resoluções CP/CNE 01 e 02/2002. A formação e diretores deve pautar-se pelo Art 64 da LDBEN e normas conexas em vigor.

II -VOTO DO(A) RELATOR(A)

Voto nos termos deste parecer, respondendo que a Resolução CP/CNE 02/97 não pode ser utilizada para conferir certificado equivalente à de diploma de licenciatura em Pedagogia, tampouco para conferir habilitação específica em Administração Escolar.

Brasília (DF), 30 de: if

Conselheiro Nelio Márco Vincenzo Bizzo – Relator

III – DECISÃO DO PLENÁRIO

O Conselho Pleno aprova por unanimidade o voto do Relator.

Plenário, em 30 de setembro de 2003.

Conselheiro José Carlos Almeida da Silva – Presidente

Consulta sobre o curso de Pedagogia – complementação pedagógica, tendo em vista o Parecer CNE/CES 337/2001 e a Resolução CNE/CP 02/97.